domingo, 21 de dezembro de 2008
domingo, 7 de dezembro de 2008
Novos artistas alemães
Tim Eitel pinta figuras de um mundo resignado
Em vez de conceitualismo, videoarte e instalação, foi o realismo figurativo que garantiu a penetração dos novos artistas alemães, após a queda do Muro, no mercado mundial da arte.
A partir do início dos anos de 1990, o mundo experimentou o fenômeno que ficou conhecido por revolução digital. Para acompanhar o desenvolvimento dos novos meios, foram inauguradas, na Alemanha, escolas como a Academia de Arte e Mídia (KHM), em Colônia, e o Centro de Arte e Mídia (ZKM), em Karlsruhe.
No entanto, em vez do esperado desenvolvimento em direção à videoarte ou à instalação, a arte alemã, a partir da última década do século 20, foi marcada pelo ressurgimento da pintura figurativa como forma de expressão artística e pela fusão da arte com a fotografia, cujo valor de mercado passou a se igualar ao das obras de pintura.
Entre os principais representantes da nova geração de fotógrafos alemães, estão Candida Höfer, Thomas Struth, Thomas Ruff e Andreas Gursky. Na pintura, destacam-se principalmente jovens artistas da pintura figurativa, como Neo Rauch, Tim Eitel, Norbert Bisky e Sophie von Hellermann, entre outros.
Após a reunificação da Alemanha, em 1990, observou-se também o deslocamento do eixo artístico situado entre Colônia e Düsseldorf em direção ao Leste do país. Berlim despontou como pólo atraente de artistas e galerias e, com o ressurgimento da pintura figurativa realista, Leipzig tornou-se uma das principais metrópoles artísticas do país.
Melancolia pós-hedonista
Artistas alemães consagrados, como Gerhard Richter, Sigmar Polke e Rosemarie Trockel chegaram ao século 21 como os mais bem cotados artistas do mundo, segundo o ranking da revista alemã de economia Capital.
No entanto, a ascensão da nova arte alemã no mercado internacional, a partir dos anos de 1990, deveu-se, tanto na fotografia como na pintura, à preferência que o mercado de arte norte-americano passou a dar aos jovens artistas alemães.
Além do caráter representativo de lifestyle que a arte assumiu, nos últimos anos, as razões deste sucesso se encontram na reação estética provocada pela revolução digital na pintura e na fotografia e nos temas abordados pelos novos artistas.
Poucos são os fotógrafos que não trabalharam suas fotos em computadores, poucos são os pintores que não pintaram suas telas a partir de fotografias. A arte alemã da virada do século tematizou a globalização, a melancolia pós-hedonista, o esvaziamento do espaço público e a história alemã a partir de 1989.
Andreas Gursky e outros artistas
Figurativa e realista, a pintura se aproximou do Realismo Socialista, desponjando-a de qualquer ameaça intelectual. A fotografia, resgatada como expressão artística, retratou subúrbios desolados, fachadas industriais sombrias, retratos enormes e paisagens longínquas e vazias. Sobretudo os alunos de Bernd e Hilla Becher, na Academia de Belas-Artes de Düsseldorf, despontaram no mercado internacional.
Nomes como Candida Höfer, Andreas Gursky, Thomas Struth e Thomas Ruff conseguiram elevar o valor da fotografia ao das obras de pintura. Em 2007, o díptico 99 Cent II, de Andreas Gursky, foi leiloado em Londres por 1,7 milhão de libras (cerca de 2,3 milhões de euros).
Esta é uma cifra impressionante, se considerarmos que o curso de Fotografia da Academia de Belas-Artes de Düsseldorf, o primeiro da Alemanha, foi instituído somente no início dos anos de 1970 e que, até o início da década de 1980, o público especializado ainda discutia o valor artístico da fotografia colorida.
Despojada de qualquer mensagem
Entre os novos pintores, destacam-se os artistas do grupo em torno de Neo Rauch, denominado de Neue Leipziger Schule ou Nova Escola de Leipzig, oriundos da Academia de Artes Visuais de Leipzig.
Escola de Leipzig foi o nome cunhado para os artistas da cidade que expuseram na documenta 6, em 1977, cuja pintura era figurativa e engajada. Mesmo depois da queda do Muro, Arno Rink, aluno destes pintores, continuou a ensinar técnicas da pintura clássica na Academia de Artes Visuais de Leipzig. Rink formou a segunda geração da Escola de Leipzig.
Tecnicamente perfeita, mas despojada de qualquer mensagem e com motivos que lembram o Romantismo, a terceira geração da Escola de Leipzig ficou conhecida como Nova Escola de Leipzig.
Televisão, computador, internet
Entre os mais célebres representantes deste novo realismo da Academia de Artes Visuais de Leipzig, estão Neo Rauch e Tim Eitel. Em seus quadros, Rauch retrata a convivência pacífica de trabalhadores socialistas, nostálgicos postos de gasolina e figuras de história em quadrinhos. Tim Eitel aposta na contemplação serena de suas figuras realistas que parecem meditar num pano de fundo abstrato.
Norbert Bisky, que nasceu em Leipzig mas estudou em Berlim, consegue unir o homoerotismo ao Realismo Socialista ao retratar garotos louros que brincam sobre dunas.
A bávara Sophie von Hellermann, uma das poucas artistas que não pinta a partir de fotografias, mistura cenas de seu mundo pessoal com personagens da literatura, do cinema ou da história.
Estes jovens artistas incorporam a mudança de paradigma da cultura analógica para a cultura digital. Se, para alguns, sua mescla de mistério e cultura pop é motivo de críticas, para outros, é a fonte de onde bebe a nova arte. Sem ideologias, eles retratam a atualidade de um mundo resignado e sem perspectivas.
Eles mesmos são filhos da cultura de consumo pós-moderna e do capitalismo digital. Aprenderam a perceber a realidade não a partir do objeto real, mas através da televisão, do computador, da internet. Sua obra espelha o desejo de uma geração jovem – que muitos chamam de conservadora – por segurança, por ideais românticos, por laços sociais e por comunicação, em tempos de extremo individualismo.
Carlos Albuquerque
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
sábado, 22 de novembro de 2008
Ramalho Eanes: “educação pode corrigir atrasos”
O antigo Presidente da República foi o orador convidado para o encerramento do ciclo de conferências "As raízes falam, falam as raízes, organizado pela Comissão concelhia do PS de Santarém.
A conferência quase encheu o grande auditório da Escola Superior Agrária, numa iniciativa que, mais uma vez, extravasou o âmbito partidário, para trazer para o debate e reflexão pessoas dos mais diferentes quadrantes políticos.
Ramalho Eanes falou do "papel da sociedade civil na construção da unidade europeia e na recuperação do país num quadro promissor e ameaçador da mundialização". Apontou o exemplo de Espanha que, segundo um relatório do Deutshe Bank, dentro de apenas dois anos poderá ter o mesmo valor do PIB per capita da Alemanha. "A Educação foi o factor que mais prosperidade trouxe à Espanha, com mais investimento no ensino secundário e universitário", afirmou Ramalho Eanes, sublinhando que "37 por cento dos espanhóis, entre os 25 e os 34 anos já possuem cursos superiores, comparativamente aos 20 por cento da Alemanha".
Eanes apontou igualmente os exemplos de desenvolvimento de "outros povos europeus e do Japão, que há muito perceberam que o desenvolvimento económico assenta no capital humano e não no investimento de capital ou tecnológico".
Ramalho Eanes sublinhou que "desde o 25 de Abril, Portugal progrediu muito na qualidade de vida da população e em todos os sectores, da educação à saúde, segurança social, estradas e comunicações". "Vivemos hoje numa democracia consolidada, em que não cabem golpes, não há ameaças externas, não há império a defender; temos condições agora para sermos um povo civil, pacífico, tolerante e democrático". Porém, defende que "o futuro de Portugal tem um desafio grande que é a falta de um ideal colectivo que nos motive individual e solidariamente". Considera, porém, que "esse futuro é alcançável se houver um investimento numa educação generalizada, e uma cuidada e rigorosa definição estratégica das políticas, com um empenhamento determinado e competente de todos os sectores – Estado, mercado e sociedade civil". Considera que "temos um Estado fraco desde o 25 de Abril, com governos muito fracos, muitas vezes mais preocupados com os resultados eleitorais do que com o futuro do País, e com sub-sistemas de saúde, educação e justiça que se transformaram em corporações que tendem a satisfazer os interesses dos seus elementos em lugar de desempenharem as funções sociais que lhes competem". Prevê que o desemprego vai agravar-se e, sendo um problema de todos, exige respostas do Governo que garantam a dignidade de todos".
"É urgente o despertar dos intelectuais para quebrar corporativismos"
Ramalho Eanes defende que uma sociedade civil forte depende da existência de uma burguesia endinheirada que ponha os filhos a estudar. "É urgente o despertar dos intelectuais para a participação na sociedade civil, pois são eles que conduzem à quebra dos corporarivismos que travam o desenvolvimento".
domingo, 16 de novembro de 2008
segunda-feira, 10 de novembro de 2008
MORREU A "MÃE ÁFRICA"
terça-feira, 4 de novembro de 2008
A Arte de Ver
A ARTE DE VER
Concepção e Orientação: António Sá
Clique aqui para mais informações
domingo, 2 de novembro de 2008
Guerra à avaliação em quase cem escolas
terça-feira, 28 de outubro de 2008
Artes: Qualidade da arte pública em Portugal posta em questão em debate em Serralves
Aquele responsável considera que, na maior parte dos casos, estas intervenções, que muitas vezes se limitam a "um conjunto de calhaus ao alto", são "de muito duvidosa qualidade", pelo que mais valia que a decoração daqueles espaços tivesse sido deixada aos cuidados dos jardineiros municipais.
João Fernandes falava durante um debate sobre "Arte Pública em Portugal", realizado hoje na Casa de Serralves, no Porto, a propósito da comemoração do 10º aniversário do lançamento do Prémio Tabaqueira de Arte Pública.
O crítico de arte João Pinharanda concordou com a crítica de João Fernandes e referiu que, há poucos anos, fez uma ronda pelos municípios da cintura industrial de Lisboa para fazer uma avaliação aos muitos monumentos ao 25 de Abril que por ali abundam.
"Na realidade são muito, muito maus", afirmou.
O escultor Alberto Carneiro considerou, a este propósito, que "são muitos os exemplos em Portugal de obras de arte pública sem qualquer dignidade".
Insurgiu-se também contra a instalação de obras de arte em rotundas, considerando que "uma obra de arte numa rotunda é uma inutilidade".
"As obras de arte são para as pessoas fruírem, para conviverem o mais proximamente possível com elas, para se encostarem nelas", defendeu.
Deu como exemplo de boa prática no campo da arte pública os simpósios de escultura de Santo Tirso, que têm permitido àquela cidade reunir em pouco tempo uma espólio "valiosíssimo espólio de arte pública" de autores nacionais e internacionais.
A académica Lúcia Matos referiu que esta situação deriva, em parte do facto de, em Portugal, não existirem, como existem noutros países, entidades especializadas na mediação entre as autarquias, que encomendam as obras, e os artistas.
Na ocasião, foi também lançado o livro "7 Artistas, 7 Paradigmas, Prémio Tabaqueira", em que João Pinharanda faz um balanço do "Prémio Tabaqueira de Arte Pública".
Esta obra dá a conhecer as sete obras premiadas, cinco das quais já estão construídas, da autoria de João Pedro Croft (Sintra), Richard Serra (Fundação de Serralves, Porto), Fernanda Fragateiro (Angra do Heroísmo), Didier Fiúza Faustino (Castelo Branco) e Pedro Cabrita Reis (Coimbra).
As outras duas obras premiadas são projectos de Joana Vasconcelos (para o largo da Academia das Belas Artes em Lisboa) e de Alberto Carneiro, para a estrada da Malveira da Serra, entre Cascais e Sintra.
© 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.2008
Fonte: RTP
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
Fotografia nocturna (3º Raid Nocturno)
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
“Férias grandes levam a perder conhecimentos”
a)Os comportamentos anti-sociais dos jovens aumentam e os conhecimentos perdem-se durante as férias de Verão;
b) As férias escolares do Básico e do Secundário são demasiado longas;
c) Os jovens, em especial os de famílias mais pobres, têm demasiado tempo livre e muito pouco em que o ocupar. Um dos estudos citados revela que 80% das crianças de meios desfavorecidos afirmaram não ter nada para fazer fora da escola;
d)As férias longas podem levar os alunos a perderem competências adquiridas durante o ano lectivo, sendo que "nos piores casos estas perdas foram equivalentes a um mês de tempo escolar". Estas são mais acentuadas na matemática e ortografia e menos notórias na leitura. Também neste aspecto, os jovens de classes mais desfavorecidas são os que mais sofrem;
Ora bem, todos sabemos que as férias nos trazem algum distanciamento, e ainda bem, do trabalho que por rotina fazemos ao longo do ano. Será que alguém está convencido que durante o tempo lectivo não acontecem exactamente as questões levantadas neste estudo? Perguntem aos alunos, às pessoas em geral, no final do ano lectivo se sabem as matérias do início do ano e verão os resultados. A aprendizagem não é um saco infinito e sem fundo, está-se sempre a perder a ganhar novos conhecimentos e competências. "As perdas são reais", reconheceu Joaquim Sarmento, ao JN, acrescentando que, no entanto, se "resumem a um núcleo de competências mais ligado à memória, algo que no currículo escolar português não tem um papel central". Mas este é um aspecto que me parece saudável e até aconselhável, para que, como se costuma dizer “se reforcem as baterias”. A proposta desta instituição britânica aconselha a redução d as férias de Verão para apenas quatro semanas, distribuindo o resto do tempo de forma mais equilibrada ao longo do ano. Claro que quem faz uma proposta destas não percebe do que está a falar. Em que altura fazem os alunos os exames e as provas de acesso à universidade? Quando se fazem as reuniões de preparação do ano lectivo seguinte? Além disso, “uma solução que Joaquim Sarmento considera difícil de aplicar em Portugal, sobretudo devido às características do clima. "Com o calor, a partir de meados de Junho, é muito difícil manter as condições de aprendizagem", assegura. E com o actual calendário escolar, Sarmento acredita que uma maior distribuição do tempo de férias traria problemas às famílias, "porque a vida não está organizada para terem as crianças em casa nessas alturas".”
Questiono-me sempre porque é que na educação se parte sempre dos princípios errados para resolver “problemas” que surgem? Partamos do princípio que é verdade o que este estudo traz a lume. É á escola que cabe resolver estes problemas com prejuízos evidentes para os alunos, famílias e professores, ou à sociedade, ao Ministério da Educação e da Segurança Social, autarquias e famílias que o devem fazer? As crianças precisam cada vez mais da família, de estreitar os laços que se perdem durante o ano com a azáfama do trabalho, precisam de aprender com a família. E a responsabilidade das instituições deste País em encontrar soluções para as tais famílias de meios desfavorecidos? Para estas, que nem férias têm, provavelmente a melhor solução seria nem “fechar” a escola. Faça-se um exame de consciência, e assuma-se de uma vez por todas as responsabilidades de cada um. A escola não é um depósito e muito menos consegue resolver todos os problemas, que são cada vez mais, das nossas crianças e jovens.
domingo, 17 de agosto de 2008
Educação: Alunos com mais coragem e empatia copiam menos
Columbus, Estados Unidos, 16 Ago (Lusa) - Os estudantes universitários com melhores níveis de coragem, empatia e honestidade não terão copiado, nem o deverão fazer em exames, indica uma investigação da Universidade norte-americana de Ohio.
Estes estudantes também têm a tendência para não acreditar que os seus colegas são habitualmente desonestos nos testes.
"As pessoas que não copiam têm uma perspectiva mais positiva dos outros. Eles não notam muita diferença entre a sua atitude e a dos restantes", notou Sara Staats, co-autora do estudo e professora de psicologia.
Os recentes estudos realizados em universidades garantem que copiar é uma prática muito comum.
"Os estudantes que não copiam parecem ser uma minoria e têm muitas oportunidades para verem os seus pares copiarem e receberem recompensas com um pequeno risco de castigo. Vemos o não copiar como uma forma de heroísmo diário no contexto académico", acrescentou a investigadora.
Depois de avaliadas a coragem, a honestidade e a empatia, os investigadores separam os alunos com melhores níveis dos que apresentaram piores resultados.
Os denominados "heróis académicos" estavam na lista com melhores níveis e referiam maior culpa se tivessem copiado em comparação com os alunos com piores resultados nas três categorias analisadas.
"Os heróis não inventam desculpas, nem dizem que é aceitável copiar porque muitos outros o fazem", referiu ainda Sara Staats.
Para a investigadora, os resultados obtidos indicam haver um bom público-alvo para divulgar mensagens contra a desonestidade académica.
PL.
© 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.
2008-08-17 02:25:02
Jorge Gumbe considera difícil escrever trajecto da arte angolana
MÁRIO COHEN
O artista plástico Jorge Gumbe disse quinta-feira, no Museu de História Natural, que é muito difícil para qualquer investigador escrever a história da arte contemporânea angolana sem fazer recurso das várias colecções existentes, pelo facto destas serem parte activa e regular na evolução das belas artes nacionais.
Como comissário do prémio Ensa-Arte, Jorge Gumbe destacou a importância do acervo desta colecção de obras que, segundo ele, permite salvaguardar as obras nacionais e seus criadores, fomentar o mecenato e também criar uma base de dados sobre as artes plásticas angolanas.
“As colecções de arte possibilitam ainda fazer uma revisita à produção artística do período pós independência até o actual, por meio dos artistas e suas obras. Acredito que devido a ausência de arquivos qualificados ou instituições adequadas, como museus, o estudo da história da arte contemporânea angolana passe por estas colecções”, disse.
De acordo com Jorge Gumbe, o prémio Ensa-Arte não é só importante para os artistas angolanos, mas também ao país e à sociedade. “Penso que hoje, a colecção Ensa-Arte é uma das mais importantes do país, em termos de arte. Nela estão representados artistas de várias gerações da pintura e escultura angolana”, referiu.
O pintor explicou ainda que como comissário do prémio Ensa-Arte é sua obrigação dar a conhecer regularmente a produção e o desenvolvimento da produção artística nacional nas diferentes décadas, bem como procurar facilitar, através das artes visuais, o conhecimento histórico e cultural do país.
Para o artista, a nação angolana como um país constituído por uma diversidade de culturas e um património muito rico, na qual fazem parte povos de diferentes etnias e tradições, a existência destas colecções são fundamentais para salvaguarda destes valores.
Convidado a encerrar o ciclo de palestras sobre o Ensa-Arte, ocorrido quinta-feira, no Museu de História Natural, o artista realçou que a produção de arte contemporânea no país, hoje se tem reflectido em todas manifestações culturais. “Este facto as torna indispensáveis no estudo da cultura nacional”, frisou.
Em relação à escultura, Jorge Gumbe disse que é preciso prestar-se mais atenção a este género, visto que é uma das formas de arte mais conhecida assentes na tradição. “Apesar das mudanças, hoje a escultura moderna têm expressado imagens estéticas que são reflexos dos valores tradicionais”, esclarece.
De salientar que o ciclo de palestra, aberto terça-feira, 12, serviu para incentivar o intercâmbio entre a diversidade cultural e analisar a condição do artista, as palestras mostrarão à sociedade, através das inúmeras exposições, que a arte pode contribuir para a mudança de consciência, do desenvolvimento social e intelectual dos angolanos.
Segundo a organização do evento, os materiais produzidos também poderão ser utilizados no ensino e na pesquisa da história, arte e cultura angolana, a partir de uma faceta fundamental, porém desconhecida, do universo cultural e artístico angolano.
segunda-feira, 11 de agosto de 2008
Fernando Dores
Uma das coisas mais bonitas que a passagem de uma pessoa pelo miolo da cidade permite é não se estar a fazer conta com nada, entrar por uma porta aberta e, como por encanto, encontrar um acontecimento, uma personalidade, uma obra apreciável e o ensejo de falar de tudo isso.
A minha passagem pelo Chiado forneceu-me uma dessas oportunidades: uma exposição de Fernando Dôres, para ser mais preciso. Nota: não esquecer o chapelinho na letra “o” (que o meu computador se recusa a colocar) e bem assim o “p” na palavra “Metamorphoses”, pois é esse o título da mostra apresentada.
O conjunto de obras representa uma acumulação extraordinária de meticulosas atitudes.
Cada trabalho denuncia esse imenso vagar do espírito que permite, em cada passo que conduz à sua produção, concentrar totalidades diversas em que cada parte é destacável do todo sendo, não obstante, parte inalienável da síntese final.
Isto é: o observador pode congeminar a marcha dos gestos do artista criador; decifrar apetitosamente como tudo pode ter-se passado, encontrando em cada jornada um infinito prazer de descoberta e revelação.
Não obstante, e como já foi dito, o resultado produzido nem por isso é menos uma unidade coerente e expressiva.
Figura e fundo, uma dualidade sempre em evidência
A sucessão de episódios construtivos da obra tem outra característica muito peculiar: cada um se filia numa forma de pesquisa com características próprias; operações entre si muito diversas na manipulação dos materiais e na variedade das técnicas.
Casar tudo isso duma forma dinamicamente harmónica e sugestiva é o segredo do artista. A nós é deixado o ensejo de observar cada trabalho desde a sua génese até ao requinte do enquadramento de apresentação − mais que uma simples e substantiva moldura, quase sempre tratada como elemento adicional de surpresa.
Começo por aludir ao primeiro dos elementos presentes na “descoberta” de cada obra: a fortíssima categorização das ideias de “figura” e de “fundo”.
O céu, o chão, o horizonte ou a misteriosa distância a que se situa esse “fundo” é um exercício de subtilezas, baseado em grande número de trabalhos numa técnica da projecção de partículas de cores diversas.
Simples, dirá o observador incauto; rigoroso e expressivo digo eu, pela justeza e sobriedade das categorizações conseguidas.
O recorte e a colagem são outro dos episódios facilmente despistáveis do processo criativo, sendo apreciável a singeleza e o engenho colocado na pesquisa de cada elemento utilizado.
A decifração da origem de cada fragmento é pitorescamente poética, e revela a adopção de “achados” que equivalem ao embuste teatral de tornar complexo o que é simples e à simulação mágica de tornar simples o que é complexo.
Atravessar a ponte que nos conduz ao país das metamorfoses
Os gestos do desenho reforçados por uma ideia subtilíssima da pintura são o argumento principal de que dispõe Fernando Dôres na área da invenção (ou da revelação dos sonhos…).
Personagens que se desdobram noutras, fisiologias complexas, órgãos simbióticos que placidamente se enfrentam, todos oriundos de horizontes de estranheza que, contudo, não assustam nem amedrontam quem os visite.
Há qualquer coisa entre o pitoresco das fábulas e o absurdo dos mundos fantásticos nesta congeminação metamórfica de seres bem dispostos que convivem perfeitamente com a sua própria complexidade.
Metamorfoses, sim, seja a palavra grafada com éfe ou ph, entendendo-se a utilização desta última forma pela carga de expectativas que sugere.
“Metamorphoses”, sim, como ponte que atravessa para o país das visões problemáticas, oportunidade de fazermos as pazes com o universo das coisas estranhas e inquietantes que não conseguimos nomear.
A rádio paga por todos nós na divulgação da arte e da cultura
Ouvi esta manhã pela RDP 1, em noticiário nacional, que certa estrela de Hollywood vai inaugurar uma exposição de pintura de seu pai, em Lisboa. A notícia não era dada de modo avulso porque uma comentadora suplementar dava referências quanto à qualidade da pintura exposta, influências registadas, etc.
Os pais dos artistas de Hollywood têm todo o direito de vir fazer digressões a Lisboa, à Europa, a todo o mundo, enfim.
No entanto, as emissoras públicas de rádio (que somos obrigados a pagar junto com o recibo da luz eléctrica, quer as ouçamos ou não) e em geral a grande comunicação social sedeada na capital (que toda ela é paga por todos nós…) incluindo a Antena 2, deviam procurar dar-nos a ideia que entre a fronteira espanhola e o Oceano Atlântico há algo mais do que Lisboa, sua cultura, seus personagens e seus acontecimentos.
O que nem sempre acontece, com manifesto prejuízo para todo o país que somos, e não enobrece particularmente os próprios habitantes da enorme cidade, outrora chamada “de mármore e granito”.
Fernando Dôres, sem luxos mediáticos.
Publicada por Costa Brites em Sábado, Junho 09, 2007
Sindika Dokolo ou a arte de um coleccionador
O que o levou, pela primeira vez, a coleccionar arte?
Os meus pais tiveram um grande peso nesta opção. O meu pai foi congolês, a minha mãe é dinamarquesa e eu cresci em Paris. Houve sempre na nossa casa, por esta razão, uma interessante mistura de culturas. Estas diferentes origens produziram, desde muito cedo, uma subjectividade e personalidade fortes no meu gosto. Os meus pais levaram-me a museus por todo o mundo. Tive a oportunidade de descobrir muito cedo Atenas e a estética clássica grega, bem como o Prado e o Louvre. A segunda influência veio de um dos melhores amigos do meu pai, Jean Cambier, um importante coleccionador belga de arte pré-colombiana e daquilo a que se costumava chamar “arte africana primitiva”. Costumava passar todos os meus fins-de-semana na casa dele em Waterloo, perto de Bruxelas. Eu era apenas uma criança, mas ele acolheu-me como um amigo e partilhou comigo a paixão dele. Ensinou-me que os objectos têm alma e podem carregar um significado tão forte que podem marcar a sua vida de formas nunca esperadas. Ele pôs-me o bichinho da colecção. Anos mais tarde, em Paris, tropecei num Jean-Michel Basquiat enquanto procurava um apartamento. Estar perante um quadro de Basquiat pela primeira vez foi um momento incrível. Relembro este momento como se tivesse acontecido em câmara lenta. Nunca antes a arte me fez sentir desta forma. O quadro provocou sentimentos de familiaridade e confusão, mas, ainda assim, provocou-os de forma marcada e clara como cristal. Ele explora sentimentos de formas que nunca pensei serem possíveis – stress, força, emoção, identidade, medo, violência, sexo. Apercebi-me, naquele momento, de como as cores de uma tela poderiam expressar emoções humanas de forma tão precisa, enquanto as palavras pareciam tão limitadas, tão desajeitadas. Mais tarde, após muita investigação e negociação, acabei mesmo por adquiri-lo. Penso que me custou tanto quanto o resto da colecção. A Pharynx é uma peça muito especial para mim. Mudou o modo como olhava para a arte e como me relacionava com a arte, revelou-me o quão poderosa, intensa e ainda maravilhosa e mínima a arte contemporânea pode ser, ensinou-me que arte contemporânea africana deverá ser: expressiva, audaciosa, rítmica, sensual, universal.
Até há pouco tempo, as mais importantes colecções de arte contemporânea africana estavam na Europa: a colecção Jean Pigozzi, em França, e a colecção Hans Bogatzke, na Bélgica. Em 2003, adquiriu a colecção privada do falecido coleccionador alemão Hans Bogatzke, na Bélgica. Como é que isto aconteceu?
Começa com a minha amizade com o artista e curador angolano Fernando Alvim. Ele é um ser humano maravilhoso: muito generoso, ainda que exigente, extremamente produtivo, engenhoso e criativo. Ele tem uma habilidade fantástica para misturar arte com política, filosofia e identidade ao mesmo tempo. Ele apresentou-me a artistas em ascensão, bem como à colecção Bogatzke. Logo após o 11 de Setembro, recebi a terrível notícia da morte de Bogatzke. Imediatamente depois, o Alvim contactou-me e pediu-me para comprar a colecção. Era um pedido urgente com base no desejo deste de proteger a colecção como um todo e trazê-la para África, onde seria a primeira colecção desta importância disponível ao público africano. Pensei sobre isto; estava dez vezes acima do meu orçamento, mas apercebi-me da importância do pedido e decidi aceder ao mesmo. Comprei cerca de seiscentas peças de uma só vez e decidi incorporar 250 obras de que realmente gostei na colecção Sindika Dokolo. Decidi doar as restantes àquele que seria o futuro museu de arte contemporânea de Luanda. A partir de então, a colecção cresceu e tem, neste momento, cerca de mil peças.
Fonte:Jornal de Angola. Ler mais aqui.
domingo, 10 de agosto de 2008
O PINTOR QUE TEIMOU NA BIENAL DE CERVEIRA
Mostra amadureceu com os escândalos
"Arranje lá uma exposição de arte moderna para Vila Nova de Cerveira." O desafio, lançado pelo então presidente da câmara ao pintor Jaime Isidoro (na foto), já lá vão 30 anos, está na origem daquela que muitos não hesitam em classificar como a mais importante bienal de arte portuguesa.
Se Cerveira é hoje conhecida como a "vila das artes", em muito se deve à perseverança de quem lutou contra o povo, literalmente revoltado com o que via acontecer na pacata localidade minhota.
Corria o ano de 1978 e o nu artístico, mais do que chocar, era moralmente proibido. "Fizemos coisas que para muitos foi um choque. Uma artista francesa, na sua performance surpresa, apareceu nua num jardim a comer flores. Um escândalo!", recordou Jaime Isidoro, à conversa com o DN. "Ou a Jacinta Candeias, que nesse mesmo ano mostrou os seios, com o resto do corpo coberto por um pano."
Ainda nesta primeira edição, não faltaram as polémicas: "Numa das performances, a GNR entrou pelo pavilhão e acabou com tudo. Era um artista que representava S. Sebastião, mas que estava nu. As pessoas gritavam: 'É um homem nu' e não percebiam que aquilo era arte", conta, num tom de desconforto.
Apesar das dificuldades para implementar a bienal, que surgiu num misto de encontro internacional de artistas, Jaime Isidoro teimou em fazer afronta ao quotidiano da terra, agarrando o desafio antes lançado pelo seu amigo, e autarca de Cerveira, Lemos Costa. "Estava sempre a dizer-lhe que os presidentes de câmara só pensavam em caminhos para as quintas dos amigos e que ia esperar para ver como é que ele agia. Acabou por me surpreender com o convite", recorda ainda o pintor, hoje com 84 anos.
Logo na primeira edição, a bienal reuniu 400 obras de artistas nacionais e internacionais, num pavilhão gimnodesportivo, e logo se afirmou como a maior exposição a que se podia assistir fora dos grandes centros, como Porto ou Lisboa. Ainda hoje assim é. "Mas foi muito difícil, sobretudo para gerir as críticas locais. Para uns era uma festa de arte de comunistas, outros entendiam a bienal como um espaço de escândalos."
A oposição era tal que durante muitos anos houve quem criticasse o "grupo de parasitas que vivia à custa da câmara". Depois de tamanhas críticas, a segunda edição só foi possível realizar com a imposição de algumas limitações, a começar logo pelo fim de encontros internacionais. "Mas foi tudo feito quase da mesma forma. Só não queríamos era saber de partidos, o que importava era a boa arte. E isso, com ou sem polémica, conseguimos", sustenta.
Durante doze anos, Jaime Isidoro organizou a Bienal Internacional de Arte de Vila Nova de Cerveira. Volvidos 30 anos e mais de 500 mil visitantes, afirma que o conceito de levar a arte aos espaços mais recônditos ainda hoje se mantém válido. "Pretendia--se, e isso está correcto à vista de qualquer um, levar a arte à rua, em comunicação com a população. Mas claro que há muitos anos isso levou à confrontação. Hoje já não é assim." Até ao ano passado, a organização da bienal passou para as mãos de Henrique Silva, também ele ligado ao certame desde o início, e que assumiu um papel de amadurecimento do maior evento artístico do Minho.
"O esforço e a dignidade que levaram esses criadores e artistas a manter vivo o espírito duma bienal como a de Cerveira não se deve só aos seus organizadores, meros peões, mas sobretudo à conivência dos que ainda sabem maravilhar-se perante a linguagem da cor e do desenho", afirma Henrique Silva.
Actualmente radicado no Valadares, Vila Nova de Gaia, Jaime Isidoro continua ligado a Vila Nova de Cerveira, um pequeno concelho de nove mil habitantes, e às raízes de uma bienal que, mais do que ajudar a lançar, conseguiu consolidar. Quanto à pintura, não há dúvidas: continua a ser o seu gosto. "Vim agora de Cerveira, onde passei quatro meses no Atelier Livre, onde comia e pintava. É um local criado pela câmara e que responde àquela que era uma pretensão desde a primeira edição da bienal: ter uma Casa do Artista."
Fonte: DN online
A CRIATIVIDADE DA MULHER QUE TRANSFORMA LIXO EM ARTE
Fonte: Expresso das Ilhas
Ela faz do material desperdiçado e considerado lixo, utensílios de uso diário e produtos de decoração. Além de ajudar a preservar o ambiente, produz belos enfeites. É brasileira, mas vive entre nós há cerca de 3 anos. Aqui, além de exercer a profissão de educadora ambiental, trabalha, em parceria com o marido (cabo-verdiano) na transformação do lixo em verdadeiras obras de arte. Chama-se Malú Grossi.d
Malú Grossi considera a educação ambiental um processo de construção, que necessita do engajamento de todos. E é por isso que, desde que chegou a Cabo Verde, em 2005 se engajou nesta missão: fazer com que as pessoas tomem consciência da importância da reutilização do lixo.
No início, confessa, não foi fácil, "porque as pessoas ainda não conheciam a técnica de reciclagem em Cabo Verde". Mas com o tempo, assegura, "as pessoas foram tomando consciência".
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Leonel Moura
Fonte: Revista BRAVO! | Agosto/2008
Eu Robô
Na mostra ''Emoção Art.ficial 4.0'', em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo, uma máquina capaz de desenhar coloca a arte diante de um impasse. Até que ponto estamos dispostos a aceitar que uma obra possa ser feita com criatividade artificial?
Gisele Kato
De perto, ele não lembra em nada uma criatura ameaçadora. Com jeitão de formiga, anda de um lado para o outro do papel, pára em um ponto, volta ao anterior, segue mais um pouquinho. De repente, baixa uma de suas seis canetas coloridas e dá continuidade ao desenho cheio de traços e tons vibrantes que, devagar, toma a forma de uma pintura à Jackson Pollock (1912-1956). A associação quase imediata com o expoente do expressionismo abstrato nos Estados Unidos rendeu ao simpático e aparentemente inocente robô o nome de RAP, Robotic Action Painter ("action painting" foi o nome pelo qual ficou conhecida a escola artística baseada na pintura de Pollock). Destaque da mostra Emoção Art.ficial 4.0, em cartaz até 14 de setembro no Itaú Cultural, em São Paulo, o RAP é o orgulho do artista português Leonel Moura,pai da criatura — que observa à distância os gestos do filho e sorri, disposto a se surpreender. Moura assegura que seu robô não obedece a regras predeterminadas por ele. "Seu programa lhe dá plena autonomia para escolher por onde circular, o que fazer e quando parar", diz o artista. "Trata-se quase de um antiprograma." Ao fim de dois dias de trabalho, desde a abertura da exposição, o RAP decidiu que havia terminado uma obra. Poderia estar até hoje debruçado sobre a mesma peça ou ter-se dado por satisfeito logo nos primeiros minutos de criação. O desenho pronto — assinado por ele e por seu inventor — encontra-se pendurado em uma das paredes da instituição. É arte? Leonel Moura garante que sim e, ao bancar a resposta afirmativa, lança uma espécie de bomba no mundo das artes plásticas. A formiga elétrica, enfim, ameaça.
Macacos e Blade Runner
Concordar com o criador do robô-pintor significa acreditar que o conceito de arte sacramentado no início do século 20 já não tem mais tanto sentido assim. Desde 1913, quando Marcel Duchamp esboçou seus primeiros ready-made, ainda em Paris, essa definição liga-se à intenção do artista e sua idéia. Se Duchamp declarava que a roda de bicicleta era arte, a nós, espectadores, cabia aceitar. Por mais de cem anos, experimentamos uma era muito centrada no poder do autor sobre a obra. Com o RAP, Moura questiona esses valores: "Eu identifico arte com criatividade, com o fato de se fazer algo que não existia antes. Nenhum desenho ou pintura do meu robô se repete ou copia alguma coisa já vista. Ele não se submete a um conjunto de instruções. Ele cria", argumenta o artista português. "Quando eu anuncio a possibilidade da criatividade artificial, evidentemente proponho uma ruptura com a arte muito calcada no indivíduo. Confirmo que a arte pode nascer de um componente não-humano e sobre o qual eu, de fato, não tenho o menor controle." A tese de Moura é polêmica. Levada às últimas conseqüências, implica aceitar que tudo pode ser arte, bastando para isso que alguém — não só o próprio artista — assuma o julgamento. Ele provoca: "Estou disposto a reconhecer até que um chimpanzé faz arte. Minha única condição é a presença da criatividade".
Para entender bem a proposta de Leonel Moura, talvez seja mais fácil ver o universo em torno do RAP como uma espécie de escada. Segundo o artista português, o robô em si é sua obra de arte, afirmação endossada pelos críticos e pelo mercado. Em outro degrau, tem-se então o desenho ou a tela feitos pela máquina. De acordo com Moura, essas peças também são arte, realizadas em um segundo momento do processo, por sua própria criação. É esse o diagnóstico que gera controvérsias. A assinatura no papel grafada pelo robô, por exemplo, incomoda muita gente. Apesar de ser riscada pela máquina, deriva de comandos bem amarrados por Moura: o RAP não sabe escrever. Por outro lado, a hora em que ele termina o quadro e coloca o seu nome não está submetida a uma vontade humana: RAP decide quando seu trabalho pode, enfim, ser considerado pronto. Decide mesmo? Leonel Moura explica o seu "antiprograma" da seguinte forma: "Instalo no robô comandos binários como: 'Se tiver que usar uma caneta, escolha você se vai usar ou não. Se optar por usar uma, escolha você qual delas'. E assim por diante", diz ele, assegurando que faz sentido falar em um robô autônomo.
Para chegar ao RAP, que nasceu em 2006, e sacudir o paradigma em vigor desde Duchamp, Leonel Moura dedica-se à robótica há quase dez anos. Ele, que é representante da escola conceitual — em que a habilidade manual não tem mesmo muita relevância para determinar a qualidade de um artista —, sentiu que a arte contemporânea estava esgotada já na década de 1990. "Estagnamos nessa visão romantizada do autor, e a internet acabou de repente com essa possibilidade de endeusar tanto um artista. No universo dos sites, o que nos interessa é o conteúdo, não quem o colocou lá." Foi pensando assim que ele desenvolveu, com a ajuda de uma equipe de cientistas, o primeiro robô-pintor, apresentado em 2003, depois de dois anos de intensa pesquisa. O modelo inaugural lidava só com duas cores e, portanto, tinha de agir em equipe. Também não decidia o término de uma obra: em determinado momento, era desligado por Moura. Agora, em uma versão bem mais avançada, com nove olhos que funcionam como sensores, o RAP trabalha sozinho e se movimenta com mais autonomia. "Desse tipo são três irmãos. O que está agora em São Paulo e dois que moram em Nova York. Curiosamente, apesar de serem gêmeos, eles têm gênios bem diferentes. O RAP daqui usa muito mais a cor vermelha do que o irmão nova-iorquino", diverte-se Moura.
Em seu ateliê, em Lisboa, o artista vive cercado por vinte robôs-pintores. Confessa que, algumas vezes, se irrita com o comportamento da turma. Na galeria Leonel Moura Arte, inaugurada na capital portuguesa no ano passado, o artista vende as obras assinadas por eles. Sim, o aval do mercado as criaturas já conquistaram. Uma tela chega a custar US$ 10 mil, enquanto um desenho sai pela metade do preço. Leonel diz que especialistas em artes plásticas não distinguem as telas feitas por humanos das telas pintadas pelos formigões. "Com um detalhe curioso: em geral as mulheres preferem os quadros dos robôs." A maioria das peças produzidas pelo RAP aqui no Itaú Cultural, por exemplo, já tem os corredores da galeria portuguesa como primeiro destino. "As pessoas compram porque os quadros ficam realmente bonitos, mas também porque se encantam com a história dos robôs", explica Moura, que, ao contrário do que se pode imaginar, mantém as paredes de sua própria casa completamente nuas. "Acho que tem a ver com aquele ditado: casa de ferreiro, espeto de pau", brinca.
Impasse na arte
O artista paulistano Rodrigo Andrade, que estreou junto à chamada Geração 80, com pinturas em grandes dimensões e cheias de cor, está entre os que olham para o RAP com ressalvas. "Acho o robô simpático. Os desenhos são interessantes, curiosos, mas não consigo concordar inteiramente com a existência de uma máquina com liberdade de escolhas. O projeto é divertido, tem senso de humor, ironia, mas vejo o robô como um instrumento do Leonel Moura", diz o pintor, depois de uma visita à exposição. "Há um abuso nessa discussão sobre os limites da arte." Da mesma geração, porém dedicada às novas mídias, a também paulistana Giselle Beiguelman avalia a proposta de Moura com mais condescendência: "É uma sacada brilhante. Com o robô, ele nos alerta para essa fronteira cada vez mais híbrida entre o homem e a máquina. O que é o Projeto Genoma se não uma tradução do homem como um banco de dados?". Giselle, no entanto, se incomoda com o fato de o robô assinar a obra: "Quando o robô termina o desenho e se dirige para o canto do papel, ele volta a operar dentro das restrições impostas hoje à arte pela cultura cartesiana. O que importa é refletirmos sobre como homem, natureza e máquina se misturam nesses tempos recentes. A discussão sobre a arte do robô me parece irrelevante em relação à profundidade das perguntas que o robô em si nos coloca".
As questões levantadas pelo RAP precisam realmente de uma reflexão maior. Um dos organizadores da mostra Emoção Art.ficial 4.0, Marcos Cuzziol, concorda que entramos em um terreno ainda pouco maduro e muito deslumbrado com as possibilidades que se abriram com a chegada da internet e do computador. "O que quer dizer arte contemporânea? Para mim, o que reunimos agora é a verdadeira arte contemporânea. Mas esse conjunto não tem espaço nas coletivas dirigidas a criações em suportes mais tradicionais", analisa Cuzziol. O artista português Leonel Moura acrescenta: "Não me conformo com o termo 'arte e tecnologia' para designar o que faço. Um pincel é tecnologia. Enfim, os conceitos da nova arte estão muito vagos ainda". Isso sem falar na inexistência de um acervo dedicado a essa produção. O Itaú Cultural começou a montar um neste ano: "O armazenamento das obras desafia a instituição. Cada peça exige um cuidado específico", diz Eduardo Saron, superintendente de atividades culturais da instituição e responsável pela coleção que, por enquanto, contabiliza 14 criações em novas mídias.
Um dos desenhos assinados pelo RAP aqui em São Paulo deve integrar o acervo em breve. Vai gerar polêmica. De novo, a criação do robô é arte? Diante de um cenário assim tão frágil, a imagem do pequeno robô ganha um sentido ainda maior. Eis um trabalho de formiga mesmo — uma formiga que, se romper com as barreiras da tradição, pode, quem sabe?, estrear uma outra era na arte.
Assista a vídeos dos robôs de Leonel Moura
Onde e Quando
Emoção Art.ficial 4.0 - Emergência!. Itaú Cultural (avenida Paulista, 149, São Paulo, SP. 11/2168-1776). De 3ª a 6ª, das 10h às 21h; sáb., dom. e feriados, das 10h às 19h. Até 14/9. Grátis.