sábado, 15 de março de 2008

Rogério Ribeiro

Lisboa, 13 Mar (Lusa) - A Assembleia da República fez hoje (13 Março) um minuto de silêncio pelo falecimento do pintor e escultor Rogério Ribeiro, evocando a sua "excepcional e multifacetada personalidade criadora".
"Rogério Ribeiro, figura maior da arte portuguesa, com uma excepcional e multifacetada personalidade criadora, é uma das mais destacadas e originais personalidades criadoras enraizadas no movimento neo-realista. A sua obra é uma riquíssima e complexa construção e reflexão sobre o devir humano, sobre o seu tempo e sobre uma humanidade em certos aspectos intemporal", lê-se no voto de pesar aprovado por unanimidade.
Rogério Ribeiro, que foi também dirigente do PCP, morreu segunda-feira, em Lisboa, devido a complicações cardíacas.
Além da sua obra, no voto de pesar é também destacada a "intensa actividade cívica e política" de Rogério Ribeiro, militante do PCP desde 1975, assim como o seu combate "pela liberdade e pela democracia".
Natural de Estremoz, onde nasceu em 1930, Rogério Ribeiro formou-se na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa e era director, desde 1993, da Casa da Cerca - Centro de Arte Contemporânea de Almada.
As suas obras estão representadas em Almada, Lisboa, Chile e Japão.
VAM.
Lusa/Fim

sexta-feira, 14 de março de 2008

Porto

Foto: José Vieira

Mais Novos e família

O Centro de Pedagogia e Animação (CCB) desenha ao longo de todo o ano actividades nos campos das artes do espectáculo e das artes visuais.
Dedica-se particularmente às crianças e à população jovem. Privilegia a arte como espaço de experimentação e interrogação do mundo contemporâneo.Promove uma programação internacional que se expande em dois eixos: ESPECTÁCULOS de teatro, dança, música, circo e multidisciplinares para ver, sentir e aprender a fruir o ritual do espectáculo e OFICINAS que apresentam um diversificado catálogo de propostas de escrita, ópera, dança, cinema, pintura, representação, etc. que proporcionam experiências nos domínios do fazer, construir, realizar, interpretar, compôr, improvisar, analisar. Ocasionalmente programam-se exposições de formato pequeno.
Organizam-se, assim, dois tempos de apresentação com funções e objectivos distintos:
Primeiro, a programação semanal, em que a intenção é a de oferecer às crianças, no seu tempo escolar, a oportunidade de viverem, com os seus professores, experiências artísticas que às escolas não é possível oferecer. Esta programação constitui-se como uma “extensão” da própria escola. O que é experimentado, sentido e discutido no CCB pode ser prolongado para o interior da sala de aula. Os professores, apoiados pelos artistas que no Centro trabalharam com as crianças, levam consigo ideias, materiais e métodos para desenvolverem futuramente com os seus alunos.
Segundo, a programação de fim-de-semana, o outro tempo de apresentação das nossas actividades, em que se oferece a crianças, adolescentes e adultos, espectáculos e oficinas que têm como objectivo desenvolver hábitos culturais no interior da dinâmica entre gerações. A programação é gratuita para as crianças carenciadas e muito acessível a toda a restante população: 2€ para espectáculos e oficinas durante a semana e 4€ ao fim de semana.

quinta-feira, 13 de março de 2008

FÉRIAS DA PÁSCOA EM SERRALVES

Eis uma sugestão que me ocorre para as férias da Páscoa em família: SERRALVES
17 Mar - 28 Mar 2008 - das 09:00 às 17:30
Este programa convida os mais novos a passarem umas férias diferentes e divertidas em contacto com a arte e a natureza. A partir de vivências no Museu, no Parque, e na Quinta, pretende-se estimular a criatividade, desenvolver a capacidade de expressão e comunicação, potenciar a partilha na experiência em grupo, dando ênfase a actividades de carácter lúdico.
Calendário: 17 a 20 Março 08 / 24 a 28 de Março 08Horário: 9h00-12h30 / 14h00-17h30Lotação: 15 participantes
Para se inscrever, imprima a ficha de inscrição, preencha-a e envie juntamente com o pagamento para a Fundação de Serralves.

Páscoa divertida!


Oficina de Expressão Plástica


O Surrealismo


A partir do dia 15 de Março de 2008, o Centro de Estudos do Surrealismo tem patente na sua sede na Fundação Cupertino de Miranda (Vila Nova de Famalicão) a exposição O Surrealismo na Colecção Fundação Cupertino de Miranda I. A exposição apresenta 96 obras (pinturas, desenhos, fotografias, objectos e esculturas) do acervo da colecção do Centro de Estudos do Surrealismo – Fundação Cupertino de Miranda nas múltiplas variantes linguísticas, genéricas, temáticas e técnicas da produção plástica, dos autores que protagonizaram a aventura da intervenção surrealista em Portugal.

Assim, e num rápido passeio pelos labirintos do ver, do sentir, do sonhar e do dizer, dos artistas representados, poderá o visitante encontrar as seguintes presenças familiares:

Carlos Eurico da Costa e os seus desenhos de fragmentos e ruínas de seres, ruas, edifícios e objectos resgatados da mítica e alucinada cidade de Palagüin.

O surrealismo-expressionismo do Júlio, dos anos 30, e um percurso de singularidade de Manuel D’Assumpção.

Uma das raras obras plásticas conservadas de Alexandre O´Neill, o poeta daquele “adeus português” que tão bem soube traduzir o naufrágio do amor, da liberdade, do desejo, da poesia – isto é, do Surrealismo.

Algumas poucas obras de Alfredo Margarido, Fernando Alves dos Santos e Fernando José Francisco (hoje “ressuscitado” e de quem Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas sempre disseram ser o mais dotado do seu grupo para as artes plásticas).

António Pedro e António Dacosta, deste último quatro obras, e do primeiro cinco, das quais quatro doadas pelo seu íntimo amigo José-Augusto França. E do “grupo” por eles animado – um dos dois em que acabou dividido o núcleo inicial do Surrealismo português – uma obra de Cândido Costa Pinto e outra de João Moniz Pereira, bem como duas de Marcelino Vespeira, todas bem representativas dos mundos intelectuais, sentimentais e estéticos dos seus respectivos autores.

António Maria Lisboa, o “timoneiro” da nau dos novos argonautas – como disse dele outro dos autores aqui bem representados, Risques Pereira – que morreu jovem de mais e de cuja obra só nos deixou à morte fragmentos, tentativas e iluminações fulgurantes.

Pedro Oom e Mário Henrique Leiria, talvez mais conhecidos pela sua poesia lírica, o que é particularmente injusto no caso dos artistas surrealistas, que nunca aceitaram fronteiras entre as muitas maneiras de tentar traduzir a experiência da vida.

Linguagens diferentes da pintura e do desenho, como a escultura – que tem no Surrealismo português um nome luminoso, Isabel Meyrelles, com os seus fantásticos bestiários metamórficos – ou a fotografia, com Fernando Lemos inaugurando rupturas sucessivas numa linguagem particular.

Contribuir para a preservação da memória do Surrealismo português, na evidência material das suas produções artísticas, eis um dos objectivos desta exposição. Lembrar e homenagear através delas a aventura fáustica dos seus autores, eis um segundo objectivo. Mas cumpre sublinhar um terceiro objectivo, mais profundo e mais importante, embora menos evidente: ajudar a manter acesso o sonho de transformação coincidente do "homem interior" e do "homem exterior" que sempre presidiu a vida - e às vezes avançou a morte - dos homens e mulheres que lutaram e lutam por ser alguma coisa mais do que simples "cadáveres adiados que procriam".

Mecenas: Millennium BCP

Comissários: Perfecto E. Cuadrado e António Gonçalves

Sindrome de Burnout


Descoberta no Brasil recentemente, a Síndrome de Burnout está transformando a vida dos professores. Cada vez mais apáticos, desiludidos, frustrados profissionalmente, a síndrome provoca ausência e distanciamento, os professores estão doentes.
A Síndrome de Burnout atinge 25% dos professores, de acordo com uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).Burnout não é stress, depressão ou angústia, é pior, pois o professor se transforma num robô, o que é muito grave, porque a educação pressupõe dedicação. Essa síndrome faz com que o trabalhador perca o sentido de sua relação com o trabalho, de forma que nada mais importa, e qualquer esforço parece inútil, causando uma enorme desmotivação quando o profissional se depara com a violência que vem atingindo as escolas, tanto públicas quanto particulares. Essa violência, além de atingir os professores, prejudica o desempenho dos alunos.Os professores, além de levarem exercícios, correções de provas, para trabalharem em casa, levam também os problemas e as dificuldades de cada aluno.
O magistério é encarado pelo professor como uma missão que pode levar à Síndrome de Burnout, se não for cumprida. O que os move ao sair para o trabalho, muitas vezes, é o sentimento de obrigação. Não vêem o resultado do seu trabalho e se sentem impotentes ao lidar com os alunos.
CAUSAS
A Síndrome de Burnout engloba diversos fatores, entre eles estão as dificuldades e os problemas que cada aluno apresenta. Naquele que se envolve com as drogas, que está se iniciando no mundo do crime ou no outro que não aprende, pois o pai abandonou a casa. Tem aquele que sofre com a violência doméstica, abuso sexual. O que não pode comprar material (muitos dos alunos depredam o material que ganham), o que briga na rua, entre outros.O professor quer mudar a vida do seu aluno, está comprometido com seu futuro, mas às vezes essa vontade se torna algo semelhante a remar contra a maré, pois, não há interesse por parte de alguns, e aqueles que se interessam, não absorvem por não possuírem base.Há, ainda, aquele que não comparece a aula para marcar presença na Divisão de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente (DOPCAD), por porte ilegal de arma, de drogas ou envolvimento em assaltos.Casos de agressão não são raros contra alunos e, até mesmo, contra os professores. Fazem até uma lista de quem vai apanhar, ameaçam de morte e arremessam objetos contra os professores. Atos dessa natureza além de provocar medo nos alunos, trazem a frustração para os professores.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Carta de uma Professora


«Não é a primeira vez que tenho a oportunidade de ler textos escritos pelo jornalista Miguel Sousa Tavares. Anoto
que escreve sobre tudo e mais alguma coisa, mesmo quando depois se verifica que conhece mal os problemas que aborda. É o caso, por exemplo, dos temas relacionados com a educação, com as escolas e com os professores. E pensava eu que o código deontológico dos jornalistas obrigava a realizar um trabalho prévio de pesquisa, a ouvir as partes envolvidas, para depois escrever sobre a temática de forma séria e isenta.
O senhor jornalista e a ministra que defende não devem saber o que é ter uma turma de 28 a 30 alunos, estando atenta aos que conversam com os colegas, aos que estão distraídos, ao que se levanta de repente para esmurrar o colega, aos que não passam os apontamentos escritos no quadro, ao que, de repente, resolve sair da sala de aula. Não sabe o trabalho que dá disciplinar uma turma. E o professor tem várias turmas. O senhor jornalista não sabe (embora a ministra deva saber) o enorme trabalho burocrático que recai sobre os professores, a acrescer à planificação e preparação das aulas. O senhor jornalista não sabe (embora devesse saber) o que é ensinar obedecendo a programas baseados em doutrinas pedagógicas pimba, que têm como denominador comum o ódio visceral à História ou à Literatura, às Ciências ou à Filosofia, que substituíram conteúdos por competências, que transformaram a escola em lugar de recreio, tudo certificado por um Ministério em que impera a ignorância e a incompetência. O senhor jornalista falta à verdade quando alude ao «flagelo do absentismo dos professores, sem paralelo em nenhum outro sector de actividade, público ou privado». Tal falsidade já foi desmentida com números e por mais de uma vez. Além do que, em nenhuma outra profissão, um simples atraso de 10 minutos significa uma falta imediata. O senhor jornalista não sabe (embora a ministra tenha obrigação de saber) o que é chegar a uma turma que se não conhece, para substituir uma professora que está a ser operada e ouvir os alunos gritarem contra aquela «filha da puta» que, segundo eles, pouco ou nada veio acrescentar ao trabalho pedagógico que vinha a ser desenvolvido. O senhor jornalista não imagina o que é leccionar turmas em que um aluno tem fome, outro é portador de hepatite, um terceiro chega tarde porque a mãe não o acordou (embora receba o rendimento mínimonacional para pôr o filho a pé e colocá-lo na escola), um quarto é portador de uma arma branca com que está a ameaçar os colegas. Não imagina (ou não quer imaginar) o que é leccionar quando a miséria cresce nas famílias, pois «em casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão». O senhor jornalista não tem sequer a sensibilidade para se por no lugar dos professores e professoras insultados e até agredidos, em resultado de um clima de indisciplina que cresceu com as aulas de substituição, nos moldes em que estão a ser concretizadas. O senhor jornalista não percebe a sensação que se tem em perder tempo, fazendo uma coisa que pedagogicamente não serve para nada, a não ser para fazer crescer a indisciplina, para cansar e dificultar cada vez mais o estudo sério do professor. Quando, no caso da signatária, até podia continuar a ocupar esse tempo com a investigação em áreas e temas que interessam ao país. O senhor jornalista recria um novo conceito de justiça. Não castiga o delinquente, mas faz o justo pagar pelo pecador, neste caso o geral dos professores penalizados pela falta dum colega. Aliás, o senhor jornalista insulta os professores, todos os professores, uma casta corporativa com privilégios que ninguém conhece e que não quer trabalhar, fazendo as tais aulas de substituição. O senhor jornalista insulta, ainda, todos os médicos acusando-os de passar atestados, em regra falsos. E tal como o Ministério, num estranho regresso ao passado, o senhor jornalista passa por cima da lei, neste caso o antigo Estatuto da Carreira Docente, que mandava pagar as aulas de substituição. Aparentemente, o propósito do jornalista Miguel Sousa Tavares não era discutir com seriedade. Era sim (do alto da sua arrogância e prosápia) provocar os professores, os médicos e até os juízes, três castas corporativas. Tudo com o propósito de levar a água ao moinho da política neoliberal do governo, neste caso do Ministério da Educação.

Dalila Cabrita Mateus, professora, doutora em História Moderna e Contemporânea».

Carta aberta à geração dos meus filhos


Carta-aberta à geração dos meus filhos
Meus Amigos:
Confio em vocês. Sou a favor do fosso intergeracional e adoro que os mais novos não concordem com os mais velhos. As sociedades avançam por rupturas, as famílias crescem emocionalmente quando se confrontam sem se afrontarem.
Cresci numa família democrática. Os meus pais estimulavam a discussão com os dois filhos e não se importavam de gastar horas a defender os seus pontos de vista. Foi assim que aos 12 anos comecei a entender a democracia, quando o meu irmão, sete anos mais velho, me explicou Humberto Delgado.
Não quero recordar-vos Salazar e Caetano. Sei que isso está fora do nosso (meu e vosso) tempo. Apenas quero reivindicar uma coisa: os corajosos da minha geração fizeram o 25 de Abril de 1974 para que vocês, geração dos meus filhos, crescessem em liberdade.
(Capital)

Quando digo a alguém da vossa idade que, há trinta anos, não se podia dizer tudo o que apetecia, quase não acreditam. Compreendo: viveram a poder exclamar o amor e a saudade, a ternura e a raiva. Quando queriam, puderam romper, sem medo, com tudo com que não concordavam.
É por isso que peço para estarem muito atentos. Não uso frases do passado, género «fascismo, nunca mais» ou «a democracia está em perigo». Não é verdade, e são expressões que vos causam tédio. Quero apenas dizer-vos que, se não ousarem, falharão no essencial: deixarão de construir uma sociedade melhor para os vossos filhos (nesse aspecto, os «velhos» não falharam, vive-se hoje bem melhor do que na juventude dos meus pais).
Pois bem: vejam o "governo" da República. Portugal transformou-se no paraíso dos humoristas. Existem tantas graças sobre os nossos "governantes", que se atropelam nas cabeças dos criativos de humor. E se tantas vezes não sabemos se a «Sit Down Comedy» de Luís Filipe Borges, neste jornal, ou as páginas do Inimigo Público são notícias a brincar ou descrições realistas, a verdade é que nos assalta a certeza de que Portugal vai mal.
Nesta semana vi estudantes espancados e a levar com gás, como era habitual no meu tempo, mas julgava impossível no vosso tempo; ouvi o director-geral das Prisões a propor a redução das visitas aos presos, para melhorar o problema da droga no sistema prisional; e indignei-me com o ministro da Presidência a falar dos limites à independência, a propósito da televisão pública.
Se deixarmos estes factos sem protesto, o risível "governo" que temos proporá mais: voltarão os jactos de tinta e mais prisões sobre estudantes; serão definitivamente proibidas as visitas aos presos, e o problema da droga no sistema será resolvido; os directores de programação das televisões e os directores de alguns jornais reportarão directamente ao ministro da tutela; o insucesso escolar acabará, graças a um despacho da prof. Maria do Carmo Seabra: todos os alunos com duas negativas no Natal serão automaticamente expulsos da escola. E o "governo" continuará a sorrir, centenas de conselheiros de imagem ajeitarão as gravatas dos ministros e o cabelo das ministras, todos dirão que tudo vai bem.
Sei que vocês não aguentarão mais. Ouço-vos em toda a parte, por enquanto em surdina, em breve até que a voz vos doa. E por isso vos peço: ajudem a derrubar este governo.
Pela verdade e dignidade da vossa geração. Para que, tal como os vossos pais quando contaram 1974, possam dizer aos vossos filhos: sabes, fizemos um segundo 25 de Abril, só com arte e coragem, e o governo foi--se embora.
Com toda a v(n)ossa força

Daniel Sampaio

Porque não ouvem quem sabe?

CIDADANIA É ISTO


Mário , Crespo, Jornalista

Maria de Lurdes Rodrigues não tem condições para continuar a gerir o sistema de educação em Portugal. Porque já não é eficaz nessa função. Porque é um facto insofismável que o pessoal que ela administra não aceita a sua administração. Isso esvazia de conteúdo as suas funções. Já não está em causa a eficácia da sua política. A questão é que ela não vai conseguir implementar as boas ideias que tem, nem impor as más. O argumento de a manter no cargo para não "desautorizar" o Primeiro-ministro é falso e perigoso. Mantendo-a nas funções que desempenha a desautorização do governo de Sócrates é constante. Chegou a altura de ver que isso é mau para os alunos. Só podem ser eles quem está em causa. Não pode haver razões de defesa de imagem política que justifiquem esta intransigência porque a manutenção de um percurso de imposição administrativa começa a ser um risco de segurança nacional. É péssimo para o quotidiano escolar ter um sistema totalmente desautorizado com professores a desafiarem o governo e o governo a desautorizar-se em frémitos de afirmação de voluntarismo vazio. Da necessidade de reformas sabe-se com fundamento científico desde o trabalho de Ana Benavente que denunciou que um quarto dos portugueses mal sabia ler e que só dez por cento da população é que entendia completamente aquilo que está escrito. Mas esse estudo tem década e meia e nada de substancial foi feito no entretanto. Por isso, o que está em questão não é a avaliação de professores. Apreciações de desempenho são meros pormenores de gestão de pessoal. O que é preciso, como consta de uma lúcida reflexão dos docentes da Escola Rainha D. Amélia, é fazer a escola cumprir com as suas funções na socialização de crianças e jovens. É promover a criação de hábitos de disciplina interiorizados que se multipliquem depois na vida adulta. Entre Cavaco Silva, o governante confrontado com o estudo de Ana Benavente, e José Sócrates, este processo de calamitosa estupidificação do país não foi interrompido por um projecto lúcido. O governo actuou agora como se o problema estivesse nos docentes e não no sistema de docência e nos curricula. Actuou como se o problema único de Portugal fosse o do excesso de privilégios e não o do defeito de cultura.

E assim as frágeis construções da demagogia política trouxeram, mesmo com a intimidação de PSPs à paisana e processos disciplinares da DREN, uma centena de milhar para as ruas de Lisboa. E o Primeiro-ministro mostrou a sua fibra assistindo em silêncio ao martírio de Maria de Lurdes Rodrigues que se desdobrou nas TVs a tentar demonstrar o indemonstrável axioma socrático que a sua política é infalível e o défice de compreensão é do país. A resposta de Sócrates foi a de marcar uma manifestação de desagravo para o Porto. Primeiro era para ser na rua, depois numa praça, depois num pavilhão e vai sempre soar a falso no clamor sem fim das turbas dos indignados. Foi um contra-ataque ridículo no meio de muito comportamento bizarro. O Professor Augusto Santos Silva protagonizou o momento de infelicidade quando em Chaves quis assinalar os três anos de governação numa espécie de estágio para o anunciado comício do desagravo. Foi vaiado. Ripostou tentando conjurar os seus Manes. Invocou os nomes dos pais fundadores, dos velhos companheiros que diz serem os seus da luta que diz ser a sua. Salgado Zenha, Mário Soares e Manuel Alegre. E nenhum lhe respondeu. Tentou depois o exorcismo, amaldiçoando os seus demónios pessoais, os grandes e os mais pequenos. Álvaro Cunhal e Mário Nogueira. E nenhum lhe respondeu. Ouviu vaias cada vez mais altas e a voz embargou-se e disse: "eu não me calo...eles calam-se primeiro que eu." Depois repetiu, baixinho como que a querer convencer-se "...eles calam-se primeiro que eu". E não se calaram. Ao ouvir na Antena 1 este terrível registo de desgovernação só me ocorreram as sábias palavras de Juan Carlos para o tiranete venezuelano: "por que no te callas".

Uma rectificação há duas semanas partilhei com quem me lê as minhas opiniões sobre os méritos de um pedido de desculpas pelos excessos coloniais. Quis um lapso infeliz que a minha crónica saísse com um título em que se dizia que os excessos da descolonização exigiam desculpas. Obviamente, como se depreendia de todo o meu texto, quis dizer e disse, que os excessos da colonização é que mereciam retrato. Novamente na minha opinião a descolonização em si foi dos actos mais redentores na história de Portugal. Não há que pedir desculpas por isso. Há que aplaudir. Agradeço ao General Pezarat Correia o ter-me chamado a atenção para este erro que agora corrijo.

terça-feira, 11 de março de 2008


Repudio

Passo a transcrever um pequeno texto com o qual me identifico no repudio ao artigo de opinião do cidadão emídio rangel, que demonstra total ignorância e senso democrático.




"Como é que é possível um ignorante deste calibre envergonhar e emitir opiniões absurdas destas num jornal, chegando a ofender (eu sinto-me altamente ofendido) milhares de pessoas em praça pública?? Uma opinião que começa com um relato de algo que ainda nem sequer tinha começado.... O Jornal saiu antes de se iniciar a manifestação!!! Desculpem a minha ignorância mas pergunto: é possível processar este fulano? Reparem como trata Professores, Partidos, etc. Que demonstração de raiva, de ódio desmesurado, sei lá de que mais... revelando também que não percebe nada de educação, simplesmente relatando as mentiras que têm circulado acerca desta classe que está a ser massacrada como nunca se viu em lado nenhum...NEM TENHO MAIS PALAVRAS!!!!! Quem quiser protestar para o dito cujo ou para o jornal poderá fazê-lo através do endereço cartas@correiomanha.pt[1] . Sugiro que copiem e colem o texto ou que escrevam um texto pessoal.


COMO PROFESSOR, REPUDIO, DE FORMA VEEMENTE E TRISTE, A OPINIÃO EMITIDA PELO SR. RANGEL, NA COLUNA: COISAS DO CIRCO (CM, DE 08-03-08). CASO O JORNAL NÃO EMITA, NUM DOS SEUS PRÓXIMOS EDITORIAIS, UM PEDIDO FORMAL DE DESCULPA AOS PROFESSORES, COMO FORMA DE PROTESTO PELAS BARBARIDADES Aí ESCRITAS E PELAS OFENSAS NELA CONTIDAS, EU, QUE SOU LEITOR ASSÍDUO DO JORNAL, VOU DEIXAR DE O ADQUIRIR PARA SEMPRE E EXERCER A MINHA INFLUÊNCIA PARA QUE OUTROS FAÇAM O MESMO. ESPERO TAMBÉM QUE TODOS OS MEUS COLEGAS TOMEM IGUAL POSTURA... AFINAL, FOMOS MAIS DE 100.000, NÃO CONTANDO COM MUITOS OUTROS QUE, POR RAZÕES DIVERSAS, NÃO PUDERAM ESTAR PRESENTES."


segunda-feira, 10 de março de 2008

Escola Internacional do Mindelo

A Escola Internacional de Arte do Mindelo (M-EIA) abre oficialmente segunda-feira, 10, em São Vicente, com ofertas de cursos profissionais, licenciaturas, seminários e oficinas. Estarão presentes no acto a directora geral do Ensino Superior e representantes de universidades que cooperaram com o M-EIA, que este ano lectivo muda para as novas instalações no Liceu Velho.
Em simultâneo, 26 alunos do M-EIA recebem certificados de um curso profissional de Manutenção de Equipamentos Hoteleiros e Industriais. Estes são formandos de um projecto que resulta de uma parceria entre a Universidade de Las Palmas, a Fundacion Universitária de Las Palmas e o governo das Canárias e ainda dos parceiros nacionais direcção geral do Turismo, Atelier Mar, Centro de Emprego, Câmara de Comércio e ISECMAR.
O projecto M-EIA é uma iniciativa do Atelier-Mar, liderado por Leão Lopes, que tem a cultura como pressuposto de “qualidade de vida, valorização pessoal e social”, como pólo de desenvolvimento do turismo qualificado e como estruturante do tecido social. Leão Lopes garante que a M-EIA tem pretensões a afirmar-se como uma instituição cultural e artística, de forma a servir a cidade do Mindelo e Cabo Verde.
A escola pretende dar uma especial atenção ao papel das indústrias culturais como motor de desenvolvimento, riqueza e emprego e promover a cultura artística contra a exclusão, numa perspectiva pedagógica. A Escola Internacional de Arte do Mindelo oferece duas licenciaturas em Artes Visuais e Design para Comunicação e Equipamentos e cursos de extensão universitária para professores que queiram actualizar as suas experiências.
A M-EIA disponibiliza igualmente cursos de formação profissional de nível III e IV, cursos livres para estudantes de segundo e terceiro ciclo, cursos para artesãos e ainda actividades pedagógicas para crianças e workshops com várias ofertas.

domingo, 9 de março de 2008

João Dixo

João Dixo Nasceu em Vila Real, em 1941. Em 1966 licenciou-se, com 20 valores em Pintura na Escola Superior de Belas Artes do Porto. Foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian durante todo o curso e, também, entre 1975 e 1977, em Paris, onde desenvolveu um programa de investigação.A sua já longa carreira docente passa pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (1973/1997), pela ARCA/ETAC, de Coimbra, de que foi director e onde coordena o mestrado em Comunicação Estética e a licenciatura em Pintura, e pelo Departamento de Arquitectura da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, onde foi responsável pelo grupo de desenho (1986/98).Foi membro fundador do Grupo Puzzle (1974/79) e membro de La Jeune Peinture (Paris, 1974/80). Integrou o núcleo de fundadores da Bienal de Cerveira.Começou a expor individualmente em 1963. Desde então conta com mais de três dezenas, em Portugal e em França. Colectivamente já participou em mais de duas centenas e meia de exposições e em festivais de Arte e Performance, em Portugal e no estrangeiro, tanto individualmente como enquanto membro do grupo Puzzle.Está representado em diversas colecções públicas e privadas, nomeadamente no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa), Museu Soares dos Reis (Porto), Museu de Serralves (Porto), Fundação Cupertino de Miranda (Vila Nova de Famalicão), Museu Amadeo de Souza Cardoso (Amarante), Museu Malhoa (Caldas da Raínha), Museu de Ovar, Fórum da Maia, Câmara Municipal de Vila Real, Câmara Municipal de Vila Franca do Campo (Açores), Banco de Portugal, BPI, BCP, CGD, Companhia Portuguesa do Cobre, Polimaia, etc.

"Quem pinta, pinta-se". João Dixo “pinta uma trans-aparência autobiográfica”, (1) metapintando-se individualmente, mas também atingindo o universal ”Quem assim (se) pinta, não (se) pinta, pinta a pintura, pinta a vida.” (2) não para pintar imagens autobiográficas, mas tornando visível a Pintura em acção ao nosso olhar.As suas telas não são só o figurado, são opções mágicas onde se misturam tintas, pincéis, sonhos, pesadelos, mãos, amarguras, alegrias, prazeres, segredos. "A pintura diverte-me, emociona-me, comove-me, dá-me imenso prazer e muito sofrimento" - diz, referindo-se indistintamente ao acto e ao efeito de pintar.
O quadro em causa segue esta forma de estar na pintura, na tintura, diria João Dixo, essa mistura na tela de cores/ tintas e colagens que partindo sempre da matéria se desenvolve e nos transporta para mundos oníricos, viagens espaciais (vermo-nos por fora), revela-nos a nossa insignificância em termos cósmicos. A velha ideia “o homem medida de todas as coisas”, como ponto de partida, deixa de ter significado deixa de ter sentido. “ o homem deixa de ser a medida do mundo” (3) A obra aqui condensa essa capacidade de expressão individual numa dimensão cósmica. O artista apresenta-se aqui como uma espécie de interface entre o individual, o visível e o invisível, o cósmico. Esta obra permite-nos a experiência estética do olhar e da sensibilidade. Partindo de cores, tintas e colagem de pedaços de jornal, materiais finitos, pobres, irrisórios, leva-nos a viajar para a dimensão do macro, do infinito, para um lugar que já não é da dimensão humana. Deixamos de ver o EU para passarmos a ver o D(EUS).

(1) Armando Azevedo
(2) Armando Azevedo
(3) Abel Salazar

José A.C. Vieira

O sonho como experiência de translinguagem

Os estudos sobre os processos de comunicação/linguagem na era dos meios electrónicos percorrem o caminho de construir e desconstruir conceitos. As categorias conceituais que compõem o universo da comunicação/linguagem contemporânea não têm características rígidas e guardam entre si uma estreita relação. Noções como interface, interactividade, hipertexto, hipermídia, virtual, ciberespaço, cibercultura, translinguagens e outras, parecem indicar não apenas uma redefinição do papel dos meios de comunicação e das linguagens no contexto histórico e cultural da humanidade, mas um novo direccionamento das relações do homem com tudo que cria.
Nas translinguagens, o autor no sentido daquele que cria ou que teve a ideia primeira oferece múltiplas possibilidades através das quais os próprios leitores/criadores constroem sucessões temporais criando /recriando eles mesmos a obra, realizando saltos com base em informações referenciais. A obra pode permanecer estável durante certo tempo, mas esta estabilidade é em si mesma fruto de um trabalho específico de cada usufruidor/criador. A obra tende a actualizar-se, sem passar no entanto à concretização definitiva quer em termos de apreciação, sensação e mesmo em termos formais. É o real sempre em actualização. É o ser humano na sua plenitude, como criador de informações acerca do real e como criador de significações atribuídas ao real. O humano é desenvolvimento! A arte pensada pela translinguagem é encará-la no sentido do somatório, da complementaridade e da correspondência de todos os sentidos. A translinguagem é a relação, comunhão entre as várias linguagens (dos cinco sentidos). Neste sentido a translinguagem busca a sinestesia. Nenhuma arte é concebida, entendível como translinguagem enquanto se mantiver no plano da transitividade. É pela intransitividade que chegamos às translinguagens. Neste sentido poucas obras aspiram neste momento à translinguagem plena. Observamo-lo em alguns grupos como o Fluxus, os Fura del bause, no virtual, nas instalações e performances e no sonho induzido. Este último concorre para as translinguagens no sentido em que enquanto sonhamos, vemos sem ver, saboreamos sem saborear, tocamos sem tocar, ouvimos sem ouvir, cheiramos sem cheirar. Enfim sentimos em plenitude, vivenciamos algo que não se resume a nenhuma “linguagem” específica. Estamos perante a translinguagem quando deixamos de lidar, identificar determinada linguagem, para saltarmos para a dimensão humana total, o Homem Uno. Já não conseguimos fazer uma leitura hierarquizada. Palavras, imagens, objectos compõem algo conjuntamente, ampliando as respectivas potencialidades expressivas. A definição dos limites das linguagens não é perceptível. Estamos perante não do homem como medida de todas as coisas, mas como o homem como medida das suas possibilidades, das suas capacidades.

José António da Costa Vieira

A Magia e os Labirintos da Sexualidade

Deixo aqui alguns textos de autores sobre o tema da sexualidade para reflectirmos a propósito do 2º ciclo de palestras organizado pela Associação de Pais de Cantanhede.


Daniel Serrão


Ética para a intervenção dos docentes na formação para uma sexualidade saudávelGosto do título geral deste Seminário – a magia e os labirintos da sexualidade – porque ele anuncia que a sexualidade não é puramente racional; se calhar, tem um componente mágico, e a sua descoberta não é fácil, como não é fácil encontrar a saída de um caminho que não é rectilíneo mas labiríntico.O meu tema, educar para uma sexualidade saudável, na perspectiva ética de quem educa, deverá então fazer apelo à magia e dispor do fio de Ariana que me permita caminhar, com segurança, no labirinto da sexualidade e das vossas expectativas, senhoras professoras e senhores professores.Que é mágica a sexualidade todos o sabemos pela nossa experiência pessoal. E sabiam-no já os brutamontes do Neolítico quando trabalhavam, sei lá com que meios técnicos, grandes blocos de granito e os afeiçoavam toscamente para que representassem o pénis, indicador do masculino, e a vulva, essência do feminino, e essa representação, mágica, protegesse a procriação, que era, nas suas mentes ainda seguramente pouco elaboradas, uma garantia de sobrevivência biológica da espécie. Podemos ainda ver estas grandes pedras talhadas nos campos eborenses e noutros locais europeus e comprovar como, ainda hoje, muitos milhares de anos decorridos e transformada, radicalmente, a cultura neolítica numa cultura construída pela inteligência racional, os candidatos a casais procriadores as visitam e lhes oferecem, simbolicamente, as flores com as quais esperam obter a magia da fecundidade. Por muito eficazes e tecnológicas e racionais que sejam, depois, as pílulas anticoncepcionais, os dispositivos intra-uterinos, as geleias espermicidas, os preservativos, etc., elas não destroiem a magia da fecundidade que é tardiamente procurada, por vezes quando a fertilidade da mulher se aproxima do fim do seu ciclo natural e a fecundidade do casal é assim já difícil ou impossível, sem o recurso à instrumentalização da conjugação dos gâmetas no que se chama procriação medicamente assistida. Antinori ganha fortunas a tornar, de novo, férteis, mulheres menopáusicas.Entremos, então, cuidadosamente, na magia da sexualidade humana.Identifico na sexualidade especificamente humana três componentes principais: a genitalidade, o amor e o enamoramento ou ternura.Estes três componentes não consentem nenhuma ordenação hierárquica entre si, são constitutivos, todos eles da sexualidade de rosto humano, estão sempre presentes no relacionamento homem/mulher, mas o seu peso relativo na edificação da sexualidade humana é diferente segundo os tempos e os modos desse relacionamento, segundo os hábitos e as tradições culturais, expressos em mitos e interditos, segundo a qualidade humana e social dos intervenientes e segundo a maior ou menor abertura à magia inata dos afectos, à sedução poderosa dos sentimentos ou à disciplina das convicções intelectuais adquiridas.É aqui que está o labirinto que o educador vai ter que percorrer, atento a todos os desvios inúteis, obrigado a retroceder quando escolhe uma via lateral que parecia boa mas, afinal, não tem continuidade e sem nunca ter a certeza de encontrar a saída, a boa saída, aquela que porá fim à angústia que em nós provoca todo o caminho incerto.Em cada um de nós o jogo constante entre os três componentes da sexualidade, acontece no tempo, começa muito cedo, logo na definição do sexo do embrião, e só acaba com a morte corporal. O que poderá acontecer depois da morte corporal não o sabemos de ciência certa mas deixem-me dizer-vos, entre parêntesis, que tenho muita esperança na eternidade do amor.Analisemos os componentes da sexualidade humana.O primeiro é a genitalidade que, no essencial, é partilhado com os animais gonocóricos ou seja os que têm uma forma corporal masculina e outra feminina. Refere-se a genitalidade aos órgãos genitais internos e externos que configuram a morfologia do disformismo sexual. No embrião, a genitalidade está já inscrita no património genético; o embrião é, não só, um ser vivo da espécie humana, mas é um ser vivo sexuado, pela sua expressão cromossómica, logo na primeira divisão mitótica do zigoto – XX para a mulher, XY para o homem.Esta constituição genómica, expressa nos cromossomas, condiciona a formação de uma gónada sexual feminina ou masculina e a construção dos órgãos genitais próprios do sexo genético. Diferentes na morfologia do corpo os seres humanos, masculino e feminino, são igualmente diferentes na função procriadora.Nos tempos actuais a criança reconhece, muito cedo, as diferenças morfológicas externas dos corpos masculino e feminino. Pretender abafar, distrair ou anular este reconhecimento é um erro que vai iniciar um caminho perigoso e eticamente prejudicial que é o da hipocrisia sobre o conhecimento genital. Como todos os outros órgãos, os genitais têm nome e as crianças, mesmo pequenas devem poder identificá-los por um nome. Cabe à família, na sua intimidade relacional, ensinar aos filhos e filhas os nomes que identificam os órgãos genitais e responder de forma simples às perguntas sobre a função. Morfologia e função dos genitais externos devem ser ensinados de forma progressiva, que acompanhe o crescimento corporal e o crescimento das informações sobre concepção, gravidez e nascimento, recorrendo a explicações saudavelmente mágicas apoiadas nos factos reais – não é retomar a historieta ridícula da cegonha e do cansativo voo desde Paris com o bebé pendurado no bico – explicações que a criança e depois o adolescente irão, progressivamente, colar à realidade mas das quais restará um perfume saboroso de irrealidade e de sonho. “Pelo sonho é que vamos”, escreveu Sebastião da Gama e eu acho que os poetas têm sempre razão.Falei de família mas não esqueço que nos jardins-de-infância pré-primários a criança vai contactar com outras da sua idade, fora do ambiente familiar e a sua curiosidade natural, que não tem nada de libidinoso, erótico ou indecente, levou-as a procurar ver se a parte genital do corpo das outras crianças é igual ou diferente do seu. As educadoras devem encarar esta curiosidade com a maior naturalidade e ternura e começar a preparar o terreno cognitivo e emocional no qual emergirá, no tempo próprio, a complexa estrutura, emocional e racional à qual chamamos pudor. Adianto já que o pudor se desenvolve no eu pessoal, na intimidade da auto-consciência, a partir do conhecimento, mesmo que ainda impreciso, da participação dos órgãos genitais na dinâmica pessoal do prazer e da procriação.Na puberdade o aparecimento da menstruação, da erecção peniana e da masturbação masculina e feminina, com a percepção do prazer genital, constituem o tempo mais difícil, mas também o mais importante para se entrar na via da educação para uma sexualidade saudável.No nível da genitalidade no qual estamos a analisar o problema da ética de educar, a fecundação deve estar no centro das preocupações de quem educa para uma sexualidade saudável; não é ética e socialmente aceitável que uma adolescente engravide, por ela e o rapaz ignorarem o que pode seguir-se a uma relação sexual completa. Por estranho que nos pareça e apesar de toda a propaganda dos meios anti-concepcionais, os inquéritos a grávidas adolescentes e aos seus parceiros ocasionais, demonstram que as suas cabeças estão povoadas de informação tão falsas e mirabolantes que até nos custa dar-lhes crédito. Mas são uma realidade.Não se trata, como antigamente, de meter medo mas de informar de modo leal e objectivo, as adolescentes e muito em especial os rapazes, que desconhecem, em regra, totalmente, a fisiologia da genitalidade feminina, da evolução que pode ocorrer após uma relação sexual completa. Esta informação deve ser objectiva, diria naturalista, apoiada em imagens do tipo médico para um pequeno grupo, 4 a 6 jovens, separadamente para rapazes e raparigas, esta já com as primeiras menstruações e os rapazes ao redor dos 14 anos.A professora para as raparigas e os professores para os rapazes; e os que se empenharem nesta intervenção terão como objectivo evitar a gravidez nas adolescentes que irá as mais das vezes descambar numa atitude de abortamento e constituir um traumatismo para toda a vida. Esta intervenção tem exigências éticas particulares.A primeira é a da concertação com os pais e encarregados de educação. Mais do que do seu consentimento e apoio, é preciso a sua participação porque esta intervenção da Escola vai ter continuidade na Família.A segunda é a do respeito pela dignidade e intimidade do adolescente.Sabemos todos como este é um período etário eriçado de dificuldades nomeadamente no plano relacional, na rejeição de normas com origem nos adultos, na ambivalência emocional. Mas proteger um e outro, o rapaz e a rapariga, do que pode ser uma tragédia, como é a gravidez no início da adolescência, ou uma situação problemática como sempre é uma gravidez no fim da adolescência e princípio da juventude, é um objectivo que justifica todo o empenhamento da Escola e da Família.É preciso saber criar um clima de intimidade e muita seriedade com os membros do pequeno grupo, 4 a 6; saber ouvir no início e saber, depois, passar a mensagem que há-de ser centrada na gravidez precoce como o mal a evitar. Nesta fase, que direi de genitalidade técnica, a participação de um profissional de saúde experiente é muito desejável. Algumas famílias, poucas, levam as filhas adolescentes a um médico ou médica para passar a informação sobre relação genital, desfloramento, gravidez, doenças sexualmente transmitidas, anti-concepcão hormonal e preservativo.Por muito que, na perspectiva mais tradicional e conservadora, esta intervenção precoce possa ser considerada desajustada ou inoportuna, eu defendo-a com base nos seguintes critérios.1 – Temos, em Portugal, uma das taxas mais elevadas de gravidezes em adolescentes; logo o problema existe.2 – Num estudo feito por Maria Teresa Tomé sobre 315 mulheres que abortaram na zona do litoral centro, 40 ou seja, 12,7% tinham idades entre os 16 e os 19 anos e 67,5% eram estudantes; cinco destas jovens tinham já abortado anteriormente. Logo o problema de abortamento de adolescentes existe e é grave.3 – As nossas adolescentes não estão em estado de inocência neste campo, têm é informações erradas, incompletas e não integradas na estrutura pessoal. A comunicação social, principalmente a Televisão, encarrega-se de mostrar ao vivo, até nos desenhos animados, o que é a relação corporal entre os membros de cada sexo. A intervenção da Escola, concertada com a Família, não é, eticamente, um abuso e orienta-se para um objectivo altamente benéfico que é a prevenção da gravidez e do aborto na adolescência e do risco de contrair doenças sexualmente transmitidas, como a SIDA e outras.4 – Se a jovem não adquirir, pela correcta informação, uma autonomia pessoal segura desde muito cedo, no campo da relação genital, ela vai acabar vítima do abuso sexual masculino, de um jovem ou de um homem maduro, ou, o que é ainda pior, vai provocar e forçar ela própria a relação genital no quadro de uma autonomia pessoal erradamente constituída a partir de informações falsas ou insuficientes.Jovens, tratadas como objecto sexual pelos homens ou que elas próprias se consideram como objectos para o desejo sexual masculino, deverão ser um pequeno número numa sociedade moderna, justa e solidária como queremos que seja Portugal.Mas não é esta a situação em Portugal. A proliferação dos bares de alterne no Portugal profundo aproveita-se da falta de informação sobre sexualidade saudável dos jovens e também dos casais, instaurando uma marginalidade sexual, misturada com a droga e o crime. Tudo isto na outrora pacífica e patriarcal província portuguesa. O filme de João Canijo é um alerta e transcrevo-lhes uma notícia do jornal de há dias: “Um homem foi detido em Celorico de Basto acusado de violar três filhas entre os 14 e os 18 anos e de as obrigar a prostituir-se, obtendo daí a sua única fonte de rendimento, anunciou ontem a Polícia Judiciária. As investigações indicam que o detido, de 43 anos, casado, residente na freguesia de Agilde, vinha cometendo os crimes desde 2001, tendo obrigado por várias vezes as filhas a abortar.”Formar mulheres que sejam verdadeiramente, donas do seu próprio corpo, enquanto corpo sexuado, deve ser objectivo da Escola e começar cedo. Mas educar para uma sexualidade saudável não é como educar para o conhecimento da Física, da Matemática ou da História. Estes conhecimentos são e serão sempre exteriores à pessoa do aluno, fazem parte da nossa actual cultura exterior simbólica. Educar para a sexualidade, mesmo só na esfera genital é, sempre, envolver a pessoa do jovem na sua vertente de intimidade e auto-consciência.Nos dois outros componentes da sexualidade humana, a ternura, ou enamoramento, e o amor, a vertente de intimidade e de auto-consciência é claramente predominante.O enamoramento e a ternura são sentimentos construídos pelo eu pessoal sobre as emoções e os afectos; para Damásio o sentimento deve ser analisado na base do conceito de que o sentimento é a consciência da emoção revelada na auto-consciência, no eu individual. A emoção da beleza humana ou do que é percebido pelo sujeito como tal, desperta nuns o sentimento da ternura e do enamoramento, noutros o sentimento de respeito e de admiração, noutros, ainda, a paixão e o desejo da relação genital. Porque o sentimento é já uma criação da inteligência do sapiens, sapiens, é possível alguma educação para geração de sentimentos a partir de emoções, mas não podemos ter a pretensão de ver o sentimento e a palavra que o representa na auto-consciência, como um produto racional ou uma elaboração da inteligência abstracta. O grande trabalho na educação dos sentimentos relacionados com as emoções da genitalidade é a decifração e explicação do sentido das palavras com as quais os representamos. Uma boa semiótica da palavra prazer, em relação com as múltiplas emoções às quais se sobrepõe o sentimento designado por prazer, será um contributo poderoso para que o jovem descubra em si o enamoramento e a ternura e de como a genitalidade pode não ser dominadora e absorvente no universo complexo do relacionamento humano entre os sexos masculino e feminino.O enamoramento e a ternura são o componente principal da sexualidade adolescente e da sexualidade da terceira e quarta idades da vida, mas deve estar presente mesmo quando o seu papel pode ser secundarizado pelo amor e a paixão.O amor é muito complexo, é talvez o mais complexo de todos os estilos de relacionamento humano.O amor humano, especificamente humano, assume a genitalidade em todo o seu esplendor corporal, com o seu componente de desejo, de posse mútua, de prazer, de saciedade. Depois, no nível emocional, o amor exige fidelidade e exclusividade, dedicação ilimitada, mútua disponibilidade de corpos e de emoções e de sentimentos. É de uma tal exigência que entra no domínio psicológico muito perigoso da violência que conduz à libertação da pulsão de morte e à decisão de matar a pessoa que se ama; ou ao suicídio da pessoa que ama e não é amada ou é traída.O amor como expressão máxima da sexualidade humana acontece na auto-consciência onde os valores emocionais são confrontados com as ideias abstractas e as palavras simbólicas que as representam e que são, elas próprias, valores pessoais e sociais.Este confronto não é nunca pacífico e vai desde o chamado amor livre ou união de facto, como amor liberto de constrições sociais, que não é só genitalidade, entenda-se, mas é uma espécie de contrato aberto, sempre revogável, entre duas pessoas, até ao casamento monogâmico e fiel e indissolúvel, fundado numa promessa livremente expressa e elevado à dignidade de sacramento ou sinal externo pela religião de que ambos são fiéis.O amor, como poderosa força relacional, exige um compromisso, mesmo que seja temporário, mas que será rigoroso e absoluto enquanto vigorar. Nas sociedades modernas a família, como instituição civil, é a forma adoptada pelo ordenamento jurídico para formalizar esse compromisso.O amor é tudo isto: é genitalidade física e emocional, é ternura sensível, é afecto sentimental, é compromisso mútuo, é uma séria e exigente relação contratual e pode ser, num nível superior, um projecto para toda uma vida vinculado a uma Transcendência e livremente assumido.Então o amor não é um acontecimento pontual, mas um processo que se desenvolve no tempo e com o qual é possível realizar uma sexualidade saudável.Educar os jovens no período etário que não viver na Escola tem de passar por acolher e orientar a sua descoberta do enamoramento e da ternura, porque esta descoberta é o início de uma sexualidade verdadeiramente humana.Nesta fase o apoio psicológico pode ajudar a rapariga e o rapaz a compreenderem o que está a passar-se na sua vida interior e de relação e a amadurecerem, progressivamente, a sua auto-consciência. Damásio afirma que o espírito – que é o mesmo, para mim, neste contexto, que auto-consciência – é habitado pelo corpo. E tem razão, na medida em que são as percepções corporais, sensitivas, sensoriais e extra-sensoriais, que vão contribuir para preencher o campo da auto-consciência. Mas esta é, em si própria, a estrutura chave das decisões humanas.O rapaz e a rapariga sobressaltados pela descoberta do enamoramento de um pelo outro, vão viver tempos de dúvida e de angústia, mas também de um encantamento sem limites, nem de tempo nem de espaço. Cabe à Escola acolher esta primavera, que prepara o verão quente do amor, com simpatia e compreensão, na aula e fora dela, tendo em conta que se trata de afectos sem genitalidade que estão a preparar a emergência do amor na auto-consciência.A pergunta radical, nesta fase, pergunta expressa verbalmente ou pergunta insinuada por gestos e atitudes é, de facto esta: o que é o Amor? Isto que sinto e me acontece é já o amor ou terei de esperar? Será que só descubro o amor se tiver uma relação genital, uma iniciação como lhe chamam? Será que a virgindade anatómica do hímen me impede de descobrir o amor? Será que o prazer orgásmico é o amor ou que o amor é mais do que o prazer genital? Etc, etc.Estas perguntas andam no ar da Escola, dos 13-14 anos aos 17-18 anos, e a sua vivência fora das salas de aula é tão importante para a educação da sexualidade saudável como é a sala de aula para o ensino das matérias concretas.É uma transição sempre tumultuosa e a metodologia que proponho para intervenção é a de entrevista individual e privada, por iniciativa do docente quando detecta sinais indicadores de perturbação, no rendimento escolar ou nos comportamentos, e por iniciativa do jovem quando este está informado de que existe na Escola esta possibilidade de acolhimento, de consulta e de aconselhamento.A educação para o amor, como alavanca da sexualidade especificamente humana, é para ser feita por docentes sexualmente felizes; ou, não o sendo, por docentes que conhecem as motivações do seu insucesso pessoal na área do amor e as sabem usar com sentido pedagógico; e docentes que conheçam bem as diversas formas actuais de relacionamento dos adolescentes e dos adultos jovens. Sem a participação e o apoio de psicólogos este trabalho de revelar aos jovens o sentido profundo e a força modeladora do que lhes está a acontecer não pode ser efectuado; porque se for mal feito pode ter efeitos negativos e contraproducentes.Vou terminar.Não pretendi trazer aqui soluções práticas – outros intervenientes o irão fazer com melhor conhecimento da realidade nas Escolas – mas tão somente reflectir sobre a magia e os labirintos da sexualidade.Se os educadores conseguirem transmitir a magia dos diferentes componentes da sexualidade humana – genitalidade, enamoramento e amor – e de como é difícil, mas é possível, circular pelos labirintos desta sexualidade com rosto humano e descobrir a porta de saída para uma felicidade sustentada – já estará cumprido o dever ético de preparar os jovens para uma sexualidade saudável.Como em tudo, na vida, é a eles que caberá decidir entre o bem e o mal, entre a felicidade e o sofrimento, entre a saúde e a doença. A nós, educadores, cabe-nos disponibilizar os meios e ter esperança nos resultados.O que vos disponibilizei para esta difícil tarefa foi pouco. Oxalá a vossa inteligência e sensibilidade consigam transformar este pouco em muito, para beneficio da saúde sexual das vossas alunas e alunos.

Vale de Cambra, 24 de Maio de 2004

Maria Emília Costa é professora e investigadora da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto e o tema da educação para a sexualidade tem ocupado uma parte significativa do seu trabalho. Nesta curta entrevista, defende que a política para o sector não se resolve através de medidas avulsas e que a criação de um disciplina não mudará o essencial. Na sua opinião, "mais do que dar respostas é necessário questioná-las".


Qual é o seu comentário ao actual modelo de educação para a sexualidade nas escolas portuguesas?

A actual política de educação para a sexualidade não passa, na minha opinião, de um pequeno remendo numa manta que está toda ela a romper. Apesar de existir um pedido explícito da sociedade portuguesa para que as questões associadas à sexualidade sejam abordadas nas escolas portuguesas, e de em algumas delas existir uma intervenção específica neste domínio, de uma forma geral ela passa ao lado da instituição escolar.

Não será necessário alargar o debate?

Esta questão está mais do que debatida e os responsáveis políticos sabem perfeitamente o que devem fazer. Não se faz por uma questão económica e porque se prefere fazer reformas rápidas para se mostrar serviço. E esta não é, definitivamente, uma questão que se resolva com medidas avulsas. Mas anunciar a criação de uma disciplina tem mais impacto na opinião pública, toda a gente fica mais descansada porque o problema está aparentemente resolvido e não se pensa nas questões de fundo.

Qual é, na sua opinião, a forma mais adequada para a abordar?

Em primeiro lugar, considero que não se pode abordar a educação para a sexualidade apenas na adolescência. Ela deve começar logo pela educação pré-escolar, já que é durante o período de crescimento que cada indivíduo vai integrando conhecimentos e formas de se relacionar. E a sexualidade tem essencialmente a ver com relações, com o respeito por si próprio e pelo outro.Em segundo lugar, é necessário que os educadores estejam preparados para responder às questões que são colocadas pelas crianças de uma forma verdadeira, objectiva e acessível à sua compreensão. Enquanto não houver uma formação dos adultos nesta área, a educação para a sexualidade não pode ter lugar de uma forma séria. Por outro lado, continua a confinar-se a educação para a sexualidade a questões meramente informativas, nomeadamente sobre o corpo, as doenças sexualmente transmissíveis e a contracepção, que, apesar de serem importantes, não são suficientes. É preciso pensar que quando chegam à adolescência os jovens devem ser eticamente responsáveis por si próprios e pelos outros.

Concorda com a criação de uma disciplina com avaliação própria ou com a manutenção de uma formação transversal?

O ideal seria uma formação transversal, porque os jovens já têm a informação, o que falta é integrá-la.A criação de uma disciplina direccionada para as questões da saúde e da sexualidade com uma avaliação própria não me parece ser o melhor caminho. Temo que resultaria no mesmo que se passa em relação aos testes escritos: iam decorar uma série de conhecimentos, mas duvido que os integrassem na aprendizagem. Memorizar conhecimentos não serve de nada se as pessoas não sentirem motivação para eles.

O facto de a formação nas escolas estar entregue a mais do que uma entidade não trará incongruências a um processo que se espera coerente?

Mais do que formular juízos de valor sobre as entidades responsáveis pela formação nas escolas, eu gostaria de pensar que a formação dada aos jovens e aos professores deveria ser baseada em valores que não fossem impostos e permitissem aos adolescentes reflectir sobre eles. Durante o período de crescimento é necessário confrontarmos os jovens com diferentes valores para que sejam eles a construir a sua própria identidade. É importante falar do aborto e da contracepção, mas sem necessariamente tomar-se posição sobre eles.

Há quem afirme que esta política de "distribuir o mal pelas aldeias" revela, de certa forma, uma desresponsabilização do governo face a esta questão. É também essa a sua opinião?

Sim. E devo dizer que essa desresponsabilização não se limita à área da sexualidade. A maioria das escolas, por exemplo, não tem o apoio de um psicólogo, e quando este existe não têm mãos a medir para dar resposta a todas as necessidades que se lhe deparam: ajudar a resolver problemas de aprendizagem, de relacionamento interpessoal, de sexualidade, etc. O psicólogo é visto como uma espécie de bombeiro que apaga o fogo e está o problema resolvido. Mas não é essa a sua função. As escola precisam de equipas multidisciplinares, que incluissem um psicólogo e outros técnicos, de forma a abordar estas questões transversalmente.

Acusa-se muitas vezes os professores de não estarem preparados para lidar com a educação para a sexualidade pelo facto de se sentirem constrangidos ou de esta poder interferir com os seus valores pessoais.Qual é a sua opinião?

Os professores estão preparados para dar educação para a sexualidade se perceberem do que ela trata. A maioria das pessoas continua convencida que a educação para a sexualidade se resume a questões da genitalidade, mas ela não pode limitar-se a esse aspecto.Quando um aluno diz um disparate na sala de aula - como chamar maricas a um colega - ou se levanta uma qualquer questão relacionada com este tema, o professor podia e devia aproveitar essa oportunidade de um modo construtivo para levantar questões e debatê-las na sala de aula. Isso também é uma forma de educar para a sexualidade. No fundo, esta é uma questão eminentemente pedagógica e penso que mais do que dar respostas é necessário questioná-las.

Educar para a sexualidade - já!





Educar para a sexualidade - já!
Artigo no âmbito da colaboração Visionarium/ Ciência Hoje:: 2006-01-27 Por Por Oriana Geada

Os jovens portugueses têm uma iniciação sexual mais precoce do que as gerações anteriores. Os conhecimentos que possuem sobre sexualidade, provindos das fontes mais díspares são, na maioria dos casos, insuficientes e desfasados da realidade. A maioria das famílias não propicia o conjunto de saberes que um jovem deve possuir para desfrutar plenamente a sua sexualidade. Esta constrói-se e aprende-se como parte integrante do desenvolvimento da personalidade.

As estatísticas revelam que Portugal é o 2º país da Europa com maior número de adolescentes grávidas, apenas suplantado pelo Reino Unido, destacando-se também no quadro europeu do aborto clandestino. Na Europa, a incidência de doenças sexualmente transmissíveis diminuiu, mas em Portugal subiu. Mais de 40% dos portugueses nem sempre usa preservativo em relações sexuais ocasionais, ou quando têm mais do que um parceiro sexual, e 20% admite nunca o utilizar. Ultimamente Portugal tem registado melhorias significativas nos indicadores relativos à saúde sexual e reprodutiva. O aumento do uso de métodos contraceptivos, a diminuição da gravidez na adolescência e a melhoria dos indicadores de saúde materno-infantil são disso exemplo.
A Educação Sexual (ES) na escola assume um papel fundamental na formação dos jovens, que nenhum dos outros agentes de socialização consegue cumprir, pois é um espaço onde as abordagens são estruturadas e os saberes são avaliados. A escola não pode, todavia, substituir o papel da família neste processo, pois ambas são contextos de aprendizagem e socialização. A articulação escola-família é sempre desejável e fundamental para a ES dos jovens.
A ES deve promover uma abordagem integrada e transversal, enquanto dimensão essencial do percurso educativo e formativo dos jovens, implicando a articulação da escola com outros agentes educativos: famílias, profissionais da área da saúde e serviços especializados de apoio educativo. A escola – lugar de construção de saberes – suscita vivências ao nível afectivo-sexual, quer pelas iniciativas desenvolvidas, quer pelo ethos que orienta o seu quotidiano, pelo que a ES não pode limitar-se a aspectos meramente informativos. Devem debater-se ideias sobre valores e facultar-se aos jovens dados necessários para que definam as suas opções. Estes devem assumir um papel activo e participativo, manifestado desde a planificação das actividades, passando pela pesquisa de informação, pela condução dos debates, até à avaliação de todo o percurso e dos resultados alcançados.
Pela componente de intimidade que a sexualidade envolve, é fundamental que se estabeleça uma boa relação pedagógica professor/aluno, que propicie o à-vontade suficiente a uma abordagem facilitadora de interrogações e opiniões, conduza à resolução de dúvidas e à superação de dificuldades e contribua para uma perspectiva positiva da sexualidade. Nem sempre é fácil, pois debater certos temas com o à-vontade que eles exigem requer dos professores segurança e ausência de julgamentos de valor. Itens como “Amor” e “Métodos Contraceptivos” são abordados mais facilmente; o mesmo não se pode dizer de itens como “Aborto”, “Homossexualidade”, “Sexo oral e anal”. Além dos tabus sociais e do receio da “censura” dos pais, nota-se falta de formação e de segurança em si próprios.
A ES na escola não deve ser entendida como uma panaceia que assegure um futuro sem problemas. A sexualidade, como componente da intimidade, é um processo de construção individual, com dúvidas, hesitações e tomadas de decisão, feito de experiências e aprendizagens, positivas e negativas, podendo a escola contribuir para que esse caminho seja feito da forma mais construtiva e contribuir para uma vivência mais informada, gratificante e responsável da sexualidade.

Défice de atenção e hiperatividade



A agressividade no transtorno de défice de atenção e hiperactividade (TDAH):: 2006-03-17 Por Por Lucinete de Freitas Messina
As crianças com TDAH apresentam, frequentemente, comportamentos inadequados, maior dificuldade para aceitar limites, necessidade de obter recompensas de forma imediata ou em menor frequência; mas é de maior gravidade o transtorno opositor e desafiante (negar a obedecer e desafiar constantemente as figuras de autoridade). Esses aspectos podem levar, mais adiante, a um transtorno grave de conduta.
A coexistência de ambos os quadros (TDAH e Opositor Desafiante) é muito frequente e considera-se que, provavelmente, a impulsividade é o factor que favorece a união dos dois transtornos. As crianças predominantemente desatentas não demonstram este tipo de conduta; portanto, um factor associado de maior risco de comportamento agressivo irá apresentar no subtipo predominantemente hiperactivo impulsivo ou no subtipo combinado (tipos de classificação do TDAH segundo o DSM-IV).
* Psicóloga pela Florida International University USA. Mestre em Psicologia e Neurocientista do Comportamento da Instituto de Psicologia da USP e Pesquisadora executante do Departamento de Psiquiatria Infantil do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina e Psicologia da USP Master em Neuropsicologia da Saúde Mental e Demência pela Faculdade de Leon na Espanha. Doutoranda da Departamento de Neurociências e Comportamento da Instituto de Psicologia da USP
Nestes casos, a impulsividade impede que a criança analise a situação conflitante na qual se encontra utilizando os mediadores racionais ou cognitivos, e que não tente formular as regras de comportamento que o ajudaram a se controlar nessa situação.
Paralelamente ao deficit nas habilidades de mediação verbal ou auto-instruções em muitos dessas crianças, existe um déficit na aprendizagem das habilidades sociais adequadas para enfrentar as relações interpessoais com respostas não agressivas.
Por último, cabe associar ou relacionar o comportamento agressivo da criança TDAH com uma frágil auto-estima; paradoxalmente ao que pode parecer uma atitude arrogante. Atrás desta, subentende-se uma opinião muito pobre de si mesmo, de tal forma que reflecte na sua incapacidade para aceitar o fracasso ou a crítica.
Ao chegar na adolescência, o comportamento agressivo pode intensificar-se. As mudanças físicas e emocionais que poderá enfrentar qualquer criança nesta idade, podem significar uma atenuante (grave) de complicação que desenvolve em graves crises para o adolescente com TDAH no seu ambiente.
A detecção e intervenção precoce são aspectos especialmente importantes em casos de crianças com hiperactividade que apresentem oposição e conduta desafiante e determinante na evolução de ambos os quadros.
O tratamento deve contemplar a intervenção psicológica (tratamento Cognitivo Comportamental) e neuropediátrica, isso envolverá a família, a escola e, principalmente, a criança no processo.
Definição da Agressividade na Infância
A agressividade em psicopatologia definimos como:
a) “conduta intencionalmente dirigida a provocar lesão ou destruição de um objetivo (pessoal, animal ou objeto)”;
b) agressões físicas ou verbais contra os demais (ameaça, empurrões, dirigir-se aos demais com insultos ou gritos);
c) agressões contra objetos (quebra ou jogar objetos ao chão, dar pontapés);
d) e auto-agressão (bate a cabeça, arranhar-se, fazer pequenos cortes em si mesmo).
Todas estas definições podem formar una possível classificação de comportamento agressivo.
Atualmente e seguindo a classificação estatísticas dos transtornos mentais da academia americana de psiquiatria (DSM-IV, 2000), este comportamento não se considera por si mesmo uma entidade patológica, mas a parte de um conjunto de sintomas de numerosos transtornos tais como o transtorno anti-social, a esquizofrenia, o autismo, o atraso mental e o transtorno do déficit de atenção e hiperactividade.
As Causas da Agressividade.
As diversas teorias que tentam explicar a agressividade dividem-se, fundamentalmente, em ativas e reativas. As ativas ou teorias biológicas, subentende-se a origem interna da agressão, são entendidas como inatas e consistentes à espécie humana. As reativas explicam os mecanismos ambientais que facilitam e mantêm o comportamento agressivo, destacando entre elas a teoria da aprendizagem social.
Desse ponto de vista da teoria da aprendizagem social, o comportamento agressivo se dá ante uma situação de conflito que provoca um sentimento de frustração na criança. O tipo de reacção que terá a criança dependerá de como saiba reagir diante dessa situação conflitante. É dizer que dependerá de sua experiência prévia.
Os processos pelos quais tenha aprendido a comportar-se de maneira agressiva são a modelagem e o reforço (basicamente a observação por parte da criança de modelos que respondam agressivamente às situações conflitantes). Esses processos actuaram, por sua vez, como mecanismos de manutenção desses comportamentos.
Predição de Violência
Profissionais de saúde mental geralmente dizem que a violência não pode ser predita e a maioria insiste que a lei não deve pedir-lhes que façam tais profecias ao sentenciar criminosos. Eventos incomuns são difíceis de prever de forma exata e o comportamento de um paciente numa clínica ou hospital pode ser evidência insatisfatória para outros ambientes e situações, como as brigas domésticas. As predições a curto prazo podem ser mais precisas e as atuais pesquisas podem melhorá-las.
Drogas e Psicoterapia
Drogas e psicoterapia são usadas na prevenção a longo prazo e na conduta violenta. As drogas mais úteis são os neurolépticos (antipsicóticos), ansiolíticos, lítio, antidepressivos e betabloqueadores. Estas drogas atuam em sistemas de neurotransmissores usando ácido gama-aminobutírico (GABA), noradrenalina (NA) ou serotonina (5-hidroxitriptamina ou 5-HT) e também atuam nos sistemas nervosos periférico e central, reduzindo a ansiedade por supressão da emergência normal da resposta de luta ou fuga do corpo. Impede o comportamento agressivo em pacientes com transtornos cerebrais orgânicos e transtornos explosivos intermitentes.
Psicoterapia de vários tipos é usada no tratamento a longo prazo de pacientes violentos, dentro e fora dos hospitais. As drogas geralmente são suplementadas por psicoterapia de suporte oferecendo tranqüilização, incentivo e aconselhamento. Terapias de grupo e familiar são úteis em parte porque ocorre tanta violência dentro das famílias e em parte porque os pacientes em grupos discutirão questões que, de outra forma, evitariam. São confrontados por pessoas com problemas semelhantes e colocados numa posição de ajudá-las enquanto se ajudam.
O tratamento comportamental e cognitivo de pacientes agressivos visa à substituição sistemática de padrões de pensamento e comportamento potencialmente violentos por outros mais adaptativos. Os behavioristas, por exemplo, pensam na personalidade paranóica, limítrofe e anti-social como padrões de comportamento mal adaptados e rígidos. Modelos cognitivos sanam deficiências em explicações comportamentais simples de violência, levando em consideração expectativas, atribuições, interpretações, objetivos e motivações.
Essa psicoterapia é útil principalmente quando a violência resulta de um transtorno da personalidade ou de controle dos impulsos.
Ao tratar pacientes violentos, os terapeutas podem evitar. Uma reação autoritária ou punitiva, porém, é igualmente má. Violência costuma decorrer de sentimentos avassaladores de impotência e humilhação; uma resposta punitiva somente eleva a sensação de impotência e, portanto, aumenta a probabilidade de agressividade.
Mudança dos Padrões Violentos
A mudança de padrões violentos pode ser obtida diretamente por recompensas manipuladoras e estímulos ambientais ou indiretamente por alternativas de ensino. Os métodos diretos incluem punição, correção excessiva (apologias, reparações), conduta de contingência (contratos comportamentais com penas por quebra) e técnicas de autocontrole. As respostas alternativas são desenvolvidas principalmente através do treinamento de habilidades sociais e resolução de problemas. Outros métodos são limitar a exposição dos pacientes a modelos de comportamento agressivo, tornando-os menos sensíveis à provocação e ensiná-los a usar sugestão e auto-instrução para orientar suas ações. Especialmente no caso de transtornos de personalidade, a terapia do comportamento e cognitiva pode ser efetiva tanto num ambiente controlado, mas os resultados devem ser transferido para os ambientes cotidianos.
Os pacientes que tenham adquirido o hábito de agressividade acham difícil fantasiar, planejar ou antecipar conseqüências. Devem aprender a imaginar respostas alternativas as sugestões que sempre tenham evocado agressividade. Pede-se a eles que registrem situações nas quais ocorra violência e observem as recompensas temporárias: respeito intimidado, alívio de responsabilidade, ganho material e assim por diante. As más conseqüências específicas são então destacadas. Depois de aprender a perceber eventos diferentemente, os pacientes podem ser ensinados sobre outros modos de obter seus fins através do treinamento das habilidades sociais, que usa métodos tais como modelos, narrativas, elogios e feedback corretivo. O tratamento em grupo é especialmente útil por ser menos caro que a terapia individual e porque outros membros do grupo podem servir de modelo, parceiros e fornecedores de recompensas.
No treinamento das habilidades de resolução de problemas, os pacientes são ensinados a ver o ponto de vista de outras pessoas, antecipar suas reações e compreender as conseqüências de suas próprias ações. Nas famílias em que as crianças têm transtornos de conduta, poderá ser útil o treinamento de conduta familiar. Esta é uma forma de treinamento de habilidades de resolução de problemas em que os pais são ensinados a usar disciplina consistente como substituto para aspereza inconsistente. Aprendem a dar ordens claras, negociar compromissos e usar formas leves de punição.

Desenvolvimento linguístico


Pai é mais determinante no desenvolvimento linguístico dos filhos até 36 meses:: 2006-12-02


O pai pode melhorar o desenvolvimento linguístico da criançaUm estudo norte-americano revelou pela primeira vez que em famílias onde ambos os pais trabalham a figura do pai tem mais impacto na aprendizagem e no desenvolvimento da língua materna em crianças entre os dois e os três anos. O trabalho revela que, ao contrário do que geralmente se pensa, a figura do pai é mais determinante no desenvolvimento linguístico da criança até os 36 meses do que a figura da mãe.
O estudo, a publicar na edição de Dezembro da revista Geo, analisou em 92 famílias norte-americanas a quantidade de vezes que a mãe e o pai falaram com as crianças de 24 meses, assim como a estrutura utilizada na interacção. Os investigadores do "FGP Child Development Institute and UNC`s School of Education" filmaram esta interacção, especialmente durante as "horas da brincadeira", tendo um ano depois avaliado a evolução linguística das crianças. A análise das gravações revelou que embora as mães falassem mais com as crianças e lhes colocassem mais perguntas, estas acabavam sempre por se guiar pelo pai, imitando-o na construção das suas frases. Segundo o estudo, as crianças cujos pais utilizavam um vocabulário mais diverso demonstraram um maior e mais rápido desenvolvimento da linguagem, enquanto "o vocabulário da mãe não afectou de forma significativa a evolução linguística das crianças nesta faixa etária (24 meses)".
Mães usam demasiadas palavras
Os investigadores indicam que, as mulheres, "ao utilizarem demasiadas palavras na interacção, acabavam por cansar e sobrecarregar as crianças". Por sua vez, adiantam, na fase a partir dos três anos de idade é a mãe que passa a influenciar fortemente o desenvolvimento da linguagem da criança, de pendendo "a riqueza da linguagem das crianças que frequentam a escola sobretudo da riqueza da linguagem utilizada pela mãe". O estudo também revela que uma boa qualidade no cuidado e tratamento da criança nos primeiros três anos de vida influencia fortemente o desenvolvimento das capacidades linguísticas e que o nível de educação dos pais tem um impacto significativo nas capacidades linguísticas das crianças. Segundo os autores da pesquisa, estes resultados "sublinham que em famílias onde ambos os pais trabalham, o pai deve ser envolvido em todos os esforços para melhorar o desenvolvimento linguístico da criança e a preparação pré-escolar. Vários estudos anteriormente realizados descobriram que mães e pais interagem de maneira diferente com as suas crianças. Enquanto os pais costumam ser mais físicos e passar mais tempo a brincar com as crianças, as mães passam mais tempo a dar ordens.

A educação é cara? Tentem a ignorância.


Harvard aprova novo curriculo educação geral pela primeira vez em 30 anos:: 2007-05-16
Derek Bok:«A educação é cara? Tentem a ignorância»
A Universidade de Harvard aprovou terça-feira um novo currículo de educação geral, pela primeira vez em três décadas, para ajudar os estudantes a "perceberam-se como produtos de e participantes nas tradições das artes, ideias e valores". O novo currículo requer que o estudante tenha cursos semestrais em sete áreas que vão desde a argumentação ética, destreza crítica, raciocínio matemático, ciências de sistemas de vida, ciências do mundo físico e "os Estados Unidos e o Mundo". Exige também um curso com a duração de um semestre focado "na cultura e na crença das sociedades humanas". Este novo currículo surge depois de anos de debate interno sobre que cursos devem ser exigidos a todos os estudantes de Harvard. Fontes em Harvard, fundada há 370 anos para treinar ministros puritanos, disseram que os objectivos do novo currículo se centram na preparação dos estudantes para a cidadania e "para responder crítica e construtivamente à mudança e para desenvolver a compreensão dos estudantes sobre as dimensões éticas do que dizem ou fazem. David Pilbeam, reitor da Faculdade de Artes e Ciências disse que o novo currículo é um desafio para as mentes dos estudantes e para os seus interesses e necessidades. O presidente da Universidade de Harvard, Derek Bok, defendeu que o novo programa de educação geral oferece uma base impressiva para adquirir a largueza de pontos de vista essencial para uma educação fortemente liberal das artes.

Dislexia

Como conhecer o cérebro dos disléxicos:: 2008-01-02 Por Vicente Martins *
*Vicente Martins é professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú(UVA), em Sobral, Estado do Ceará. E-mail: vicente.martins@uol.com.br

A dislexia é tema de novela da Globo. O papel de disléxica em "Duas Caras" cabe à actriz Bárbara Borges, que vive Clarissa, uma jovem que tem o sonho de ser juíza, mas sempre enfrentou dificuldades leitoras. Com o apoio da mãe, ela passará no vestibular para o curso de direito. Assim como Clarissa, os disléxicos são pessoas normais que, surpreendentemente, no período escolar, apresentam dificuldades em leitura e, em geral, problemas, também, com a ortografia e a organização da escrita. Como ajudar pais, especialmente mães, de disléxicos? O presente artigo mostra como os pais, docentes e psicopedagogos, conhecendo o cérebro dos disléxicos, poderão ajudá-los a ler e compreender o texto lido.
A leitura, como sabemos, seja para disléxicos ou não, é uma habilidade complexa. Não nascemos leitores ou escritores. O módulo fonológico é o único, no genoma humano, que não se desenvolve por instinto. Realmente, precisamos aprender a ler, escrever e a grafar correctamente as palavras, mesmo porque as três habilidades linguísticas são cultural e historicamente construídas pelo homo sapiens. A leitura só deixa de ser complexa quando a automatizamos. Como somos diferentes, temos maneiras diferentes de reconhecer as palavras escritas e, assim, temos diferenças fundamentais no processo de aquisição de leitura durante a alfabetização. Esse automatismo leitor exige domínios na fonologia da língua materna, especialmente a consciência fonológica, isto é, a consciência de que o acesso ao léxico (palavra ou leitura) exige conhecimentos formais, sistemáticos, escolares, gramaticais e metalinguísticos do princípio alfabético do nosso sistema de escrita, que se caracteriza pela correspondência entre letras e fonemas (vogais, semivogais e consoantes). A experiência de uma alfabetização com êxito é importante para a nossa educação leitora no mundo povoado de letras, literatura, poesia, imagens, ícones, símbolos, metáforas e diversidade de medias e textos. A compreensão do valor da leitura em nossas vidas, especialmente, na sociedade do conhecimento, é base para desmistificarmos o conceito inquietante da dislexia e do cérebro dos disléxicos. A dislexia não é doença, mas compromete o acesso ao mundo da leitura. A dislexia parece bloquear o acesso de crianças especiais à sociedade letrada. Deixa-os, então, lentas, dispersas, agressivas e em atraso escolar. Os docentes, pais e psicopedagogos que lidam com disléxicos devem seguir, então, alguns princípios ou passos para actuação eficiente com aqueles que apresentam dificuldades cognitivas na área de leitura, escrita e ortografia. Vamos descrever cada um deles a seguir. O primeiro princípio ou passo é o de se começar pela descrição e explicação da dislexia. Uma criança com deficiência mental, por exemplo, não pode ser apontada como disléxica, porque a etiologia de sua dificuldade é orgânica, portanto, de natureza clínica e não exclusivamente cognitiva ou escolar. Claro, é verdade que um adulto, depois de um acidente vascular cerebral, poderá vir apresentar dislexia. Nesse caso, trata-se, realmente, de uma dislexia adquirida, de natureza neurolinguística e que só com o apoio médico é que podemos intervir, de forma pluridisciplinar e, adequadamente, nesses casos. Assim, tanto para a dislexia desenvolvimental (também chamada verdadeira porque uma criança já pode herdar tal dificuldade dos pais) como para a dislexia adquirida (surge após um AVC ou traumatismo), importante é salientar que os docentes, pais e psicopedagogos, especialmente estes últimos, conheçam melhor os fundamentos psicolinguísticos da linguagem escrita, compreendendo, assim, o processo aquisição da habilidade leitora e os processos psicológicos envolvidos na habilidade. Realmente, sem o conhecimento da arquitectura funcional, do que ocorre com o cérebro dos disléxicos, durante o processamento leitor, toda intervenção corre risco de ser inócua ou contraproducente. Os processos leitores que ocorrem nos cérebros dos leitores, proficientes ou disléxicos, podem ser descritos através de quatro módulos cognitivos da leitura: (1) módulo perceptivo, como o nome sugere, refere-se à percepção, especialmente a visual, importante factor de dificuldade leitora; (2) módulo léxico, nesse caso, refere-se, por exemplo, ao traçado das letras e a memorização dos demais grafemas da língua (por exemplo, os sinais diacríticos como til, hífen etc.); (3) módulo sintáctico, este, tem a ver com a organização da estruturação da frase, a criança apresenta dificuldade de compreender como as palavras se relacionam na estrutura das frases (4) módulo semântico, este, diz respeito, pois, ao significado que traz as palavras nos seus morfemas (prefixos sufixos etc.) Não é uma tarefa fácil conhecer o cérebro dos disléxicos. Por isso, um segundo passo é o aprofundamento dos fundamentos psicolinguísticos da lectoescrita. A abordagem psicolinguística (associando a estrutura linguística dos textos aos estados mentais do disléxico) é um caminho precioso para o entendimento da dislexia, uma vez que apresenta as conexões existentes entre questões pertinentes ao conhecimento e uso de uma língua, tais como a do processo de aquisição de linguagem e a do processamento linguístico, e os processos psicológicos que se supõe estarem a elas relacionados. Aqui, particularmente é bom salientar que as dificuldades lectoescritoras são específicas e bastante individualizadas, isto é, os disléxicos são incomuns, diferentes, atípicos e individualizados com relação aos demais colegas de sala de aula bem como aos sintomas manifestados durante a aquisição, desenvolvimento e processamento da linguagem escrita. Nessas alturas, todos que actuam com os especiais devem pensar o que pode estar ocorrendo com os disléxicos em sala de aula. Os métodos de alfabetização em leitura levam em conta as diferenças individuais? Os métodos pedagógicos, com raras excepções, se propõem a ser eficientes em salas de crianças ditas normais, mas se tornam ineficientes em crianças especiais. Por isso, cabe aos docentes, em particular, e aos pais, por imperativo de acompanhamento de seus filhos, entender melhor sobre os métodos de estudos adoptados nas instituições de ensino. Os métodos de alfabetização em leitura são determinantes para uma acção eficaz ou ineficaz no atendimento educacional especial aos disléxicos, disgráficos e disortográficos. A dislexia é uma dificuldade específica em leitura, e como tal, nada mais criterioso e necessário do que o entendimento claro do processo da leitura ou do entendimento da leitura em processo. Não menos importantes do o entendimento dos métodos de leitura, adoptados nas escolas, devem ser objecto de preocupação dos educadores, pais e psicopedagogos, as questões conceituais, procedimentais e atitudinais sobre a dislexia, disgrafia e disortografia. O que pensam as escolas sobre as crianças disléxicas? O que sabem seus professores e gestores educacionais sobre dislexia? Mais do que simples rótulos das dificuldades de aprendizagem da linguagem escrita, a dislexia é uma síndrome ou dificuldade revestida de conceitos linguísticos, psicolinguísticos, psicológicos, neurológicos e neurolinguísticos fundamentais para os que vão actuar com crianças com necessidades educacionais especiais. Reforça-se, ainda, essa necessidade de compreender, realmente, o aspecto pluridisciplinar da dislexia, posto que muitas vezes, é imperiosa a interlocução com outros profissionais que cuidam das crianças, como neuropediatras, pediatras, psicólogos escolares e os próprios pais das crianças. Na maioria dos casos de dislexia, disgrafia e disortografia, a abordagem mais eficaz no atendimento aos educandos é a psicopedagógica (ou psicolinguística, para os linguistas clínicos) em que o profissional que irá lidar com as dificuldades das crianças aplicará à sua prática educacional aportes teórico-práticos da psicopedagogia clínica ou institucional aliados à pedagogia e à psicologia cognitiva e à psicologia da educação. São os psicolinguistas que se voltam para a explicação da dislexia e suas dificuldades correlatas (disgrafia, dislexias). Hipóteses como défices de memória e do princípio alfabético (fonológico) são apontados, pelos psicolinguistas, como as principais causas da dislexia. O terceiro passo para os que querem entender mais sobre dislexia é dar especial atenção à avaliação das dificuldades lectoescritoras. A avaliação deve ser trabalhada como ato ou processo de colectar dados a fim de se melhor entender os pontos fortes e fracos do aprendizado da leitura, escrita e ortografia dos disléxicos, disgráficos e disortográficos. Enfim, atenção dos psicopedagogos deve dirigir-se à avaliação das dificuldades em aquisição da linguagem escrita. Nesse sentido, um caminho seguro para a avaliação da dislexia, disgrafia e disortografia é pela via do reconhecimento da palavra. O reconhecimento da palavra começa pela identificação visual da palavra escrita. Depois do reconhecimento da palavra escrita, deve ser feita avaliação da compreensão leitora, especialmente no tocante à inferência textual, de modo que levando a efeito tais procedimentos, ficarão mais explícitas as duas etapas fundamentais da leitura e de suas dificuldades: descodificação e compreensão leitoras. O quarto e último passo para o desenvolvimento de estratégias de intervenção nos educandos com necessidades educacionais especiais em leitura, disgrafia e disortografia é o de observar qual dos módulos (perceptivo, léxico etc.) está apresentando défice no processamento da informação durante a leitura. Portanto, é entendermos como o cérebro dos disléxicos funciona durante o ato leitor. Neste quarto passo, é imprescindível um recorte das dificuldades leitoras. A dislexia não é uma dificuldade generalizada de leitura, ou seja, não envolve todos os módulos do processo leitor. Descoberto o módulo que traz carência leitora, através de testes simples como ditado de palavras familiares e não-familiares, leitura em voz alta, questões sobre compreensão literal ou inferência textual, será mais fácil para os psicopedagogos, por exemplo, actuar para compensar ou sanar, definitivamente, as dificuldades leitoras que envolvem, por exemplo, aspectos fonológicos da descodificação leitora e da codificação escritora: o princípio alfabético da língua materna, isto é, a correspondência letra-fonema ou a correspondência fonema-letra. Se o que está afectado se refere ao campo da compreensão, os psicopedagogos poderão propor actividades com conhecimentos prévios para explorar a memória de longo prazo dos disléxicos que se baseia no conhecimento da língua, do assunto e do mundo (cosmovisão). Quando estamos diante de crianças disléxicas com as dificuldades relacionadas com a compreensão estamos, decerto, diante de casos de leitores com hiperlexia, parafasia, paralexia ou, se estão, também, sobrepostas dificuldades em escrita, ao certo, estaremos diante de escritores também hiperlexia, parafasia, paragrafia, termos clínicos, mas uma vez explicados, iluminarão os psicopedagogos que actuam com disléxicos e disgráficos. A paralexia é dificuldade de leitura provocada pela troca de sílabas ou palavras que passam a formar combinações sem sentido. A parafasia é distúrbio da linguagem que se caracteriza pela substituição de certas palavras por outras ou por vocábulos inexistentes na língua. A ciência e a terminologia, realmente, apontam, mais, claramente, as raízes dos problemas ou dificuldades na leitura, escrita e ortografia.